Eu fui criada por uma mãe dona de casa e um pai médico. Muito convívio com um e pouco com outro. Coube a minha mãe criar os três filhos, levar a todos os compromissos, nos manter vivos e nos educar. Ela atendia às demandas de cada um, lidava com personalidades diferentes e em meio a tantos afazeres repetia à exaustão o que era certo e errado. O resultado foi uma mãe taxada de chata até pouco tempo. Tudo mudou quando me tornei mãe.

Agora sou eu que escuto uma garota de 5 anos me chamar de chata pelo menos três vezes ao dia. Posso até ser irritante, mas em minha defesa e em defesa de todas as mães, digo: se impor limites for sinônimo de chatice, pode chamar de chata à vontade.
Normalmente a mãe é conhecida como aquela que corta o barato, aquela que deixa daqui e corta dali para satisfazer os desejos da criança quando possível, mas que sabe que uma vida desequilibrada acarreta em um futuro instável.
É também aquela que entende a importância da rotina, que além de dar conta da própria vida, trabalho e casa, fica de olho em todas as questões dos filhos, ou pelo menos tenta. Só que remar sozinha, não dá.
Imagine as seguintes cenas: uma criança estatelada no sofá olhando para uma tela, seja TV ou celular, a tarde toda e ninguém da casa pede para desligar e caçar outra coisa pra fazer. A não ser a mãe, a chata. Uma mesa de café da manhã cheia de frutas, um almoço cheio de verduras e ninguém da casa insiste para a criança comer. A não ser a mãe, aquela chata.
Brinquedos espalhados, roupas para lavar, banheiro sujo, pia lotada, nenhuma ajuda, apenas gritos e reclamações vindos da mãe, a chata. Criança entediada, insistência para jogar no celular (parece que só sabem fazer isso agora), ninguém leva para andar de bicicleta, gastar energia, só a mãe, aquela ops, agora não é mais chata.
Mataram a charada? 35206y
Se não são as preocupações das mães em relação à saúde física e mental dos filhos, não tem pai que o faça. Se não são elas impondo limites para que se tenha o mínimo de equilíbrio no uso de tecnologias, não tem outra pessoa da casa que o faça.
E se no caso os pais forem separados, aí minhas colegas, as diferenças ou indiferenças na hora de educar podem se tornar um problema.
Luana Piovani está aí como prova viva, no último mês a atriz criticou nas redes sociais a maneira como Pedro Scooby, pai de seus filhos, vinha descumprindo acordos em relação à educação das crianças. Ela reclamou sobre o o facilitado aos celulares sem nenhuma supervisão, além da falta de comprometimento com horário escolar e atraso de pensão. Luana, a mãe chata, agora está sendo processada pelo ex-marido. “Ele está tentando me calar”, afirmou a atriz.
É ótimo chegar em casa com tudo já pronto, é tranquilo ser a parte que fala sim pra tudo, é lindo ser visto como herói. Todo mundo quer a parte fácil, mas no quesito filhos, essa palavra não existe. Ainda assim, todos os dias 500 crianças são registradas sem o nome do pai, segundo a Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen).
Infelizmente a paternidade é uma escolha, a maternidade não. É a estrutura machista que teima em dizer: “quem cria é quem pare”.
Nos últimos anos muito se falou sobre maternidade real, um termo um pouco problemático (isso é assunto para outra coluna), mas que abriu espaço para as mães falarem abertamente sobre as dores da maternagem, principalmente.
Essa fresta escancarou a injusta divisão na criação de filhos e como as mães se culpam por não darem conta de uma demanda que não é só dela.
Estamos esgotadas mental e fisicamente a tal ponto que não sobram forças para lutar por uma divisão igualitária: seria essa uma estratégia dessa estrutura? Fica aí a reflexão.
E quando ainda se bate de frente com o sistema, somos taxadas de loucas e fotos nuas nossas são colocadas em processos na tentativa de justificar o injustificável. Clamamos por mudanças que podem parecer bestas para alguns pais, mas que fazem toda diferença na vida de uma criança.
Enquanto não vemos luz no fim do túnel, continuaremos, sim, a ser as mães chatas, com orgulho.