“Ser uma mulher negra em posição de liderança é carregar um navio negreiro inteiro nas costas”. A frase é de Nina Silva, uma das 100 afrodescendentes mais influentes do mundo abaixo dos 40 anos e CEO do Movimento Black Money.
A frase de Nina resume bem a solidão que as mulheres negras enfrentam ao ocupar posições de lideranças, conquista duplamente isolada por serem mulheres e pretas. Um levantamento recente feito pela consultoria Gestão Kairós ouviu 900 líderes brasileiros, destes, apenas 25% eram mulheres. Destas só 3% são negras.
O número deixa claro como são poucas as oportunidades e a rede de apoio para que mulheres negras conquistem espaços de liderança. Em muitas empresas essa possibilidade é simplesmente inexistente.
Mesmo em maioria populacional, mulheres negras representam minoria gritante em cargos de liderança – Foto: Getty Images/NDPara Jackie Anacleto, advogada há 15 anos, a opção foi construir pouco a pouco a confiança de uma carteira de clientes e empreender na categoria.
“A construção de liderança de uma mulher preta nasce com a necessidade de aproveitar as poucas oportunidades que o mercado de trabalho oferece após receber como respostas em entrevista de emprego. Ouvir a frase ‘você não se encaixa no perfil’, me levou à conclusão de que ser uma profissional liberal era a opção que me restava”, diz Jackie.
Jackie Anacleto é advogada há 15 anos. Em 2018 decidiu empreender na categoria com sua própria equipe – Foto: Arquivo pessoal/ReproduçãoEm 2018 ela resolveu encarar a “empreitada de empreender na advocacia” e de formar uma equipe. “A minha liderança tem como pilar o respeito. Dividir as minhas experiências, entender que compartilhando a gente aprende, e formar uma equipe tem, de fato agregado, muito valor ao meu servir a sociedade”, defende.
Liliane Rocha, fundadora e CEO da Gestão Kairós, que esta à frente da pesquisa acima citada, explica a importância de um olhar atento às interseccionalidades de gênero e raça quando pensamos em oportunidades.
“O estudo nos possibilita refletir sobre como a gente universaliza a questão dos direitos das mulheres pela mulher branca. Quando analisamos o nível da liderança, ficamos até felizes em ver que já temos 25% de mulheres nestes lugares. Mas quando vemos que as mulheres negras correspondem apenas a 3% deste total, enxergamos o abismo de direitos que precisamos enfrentar no Brasil”, conclui.
Quando finalmente – e quase que por um milagre- mulheres negras têm seu talento e capacidade reconhecidos e conquistam posições de liderança equiparadas a homens brancos, ainda são vistas como menores.
“Sempre que dividi o ambiente com homens era vista como a secretária, nunca como a advogada. Isso demonstra que para a sociedade ainda é difícil enxergar uma mulher como protagonista. As mulheres ainda recebem 20,5% menos que os homens quando ocupam as mesmas atividades”, destaca Jackie.
Brasil não dá oportunidade e equidade a 28% da população 66606i
Os números da pesquisa de 2022, de tantas outras, além dos dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) exemplificam como o Brasil ainda não consegue equiparar oportunidades para quem representa 28% da população nacional.
De acordo com o IBGE, 54% da população brasileira é negra. As mulheres pretas formam o maior grupo populacional do país. Mas quando olhamos postos de liderança e salários, por exemplo, somos a esmagadora minoria. A conta, de fato, não fecha.
Mulheres negras representam 28% da população brasileira – Foto: Getty Images/NDUm país formado em sua maioria por homens e mulheres negros tem o dever de promover oportunidades igualitárias e representatividade em posições de liderança equiparadas ao número populacional. Não só o governo, mas as empresas também deveriam estar preocupadas com esses números.
Quantos negros ocupam posições de liderança e relevância na sua escola, na sua faculdade, na sua corporação? Quantas mulheres negras ocupam esses postos?
É irrisório, ou melhor, é vergonhoso, apresentar estes dados em pleno 2022. É missão de todos nós promovermos oportunidades para que tenhamos mais Jackies, Ninas e tantas outras mulheres negras brilhantes. As meninas e meninos negros deste país esperam por isso.
Vamos juntas!
“A nossa fragilidade de termos sido preteridas deve ser usada como a nossa força para ir atrás do que almejamos. O termo já está desgastado, e às vezes é utilizado de maneira distorcida, mas vou insistir na palavra ‘empoderar’, que significa tomar para si uma obrigação. É nossa obrigação resistir e ocupar os lugares que almejamos” – Jackie Anacleto.
