Nos documentos consta Monique Cavalcanti, mas nas pinturas a é Gugie.
Brasiliense, veio para Florianópolis aos 10 anos, por conta da transferência do pai, militar da Aeronáutica, que também era formado em artes plásticas e a quem acompanhava em visitas a museus.
Pouco depois, ela ingressou nas danças urbanas, e na cultura hip-hop despertou o interesse pelo grafite.
Após cursar eletrotécnica no Ensino Médio, no IFSC (Instituto Federal de Santa Catarina), e estagiar em uma empresa de engenharia, foi direto para o vestibular em artes. “Eu virava os projetos e começava a desenhar atrás das folhas enormes”, conta.
Estudou artes visuais na Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina), ganhou prêmios e a carreira, literalmente, a levou às alturas, pintando muros e paredes inteiras de prédios em diferentes regiões do país.

Seus trabalhos individuais e coletivos são facilmente visíveis em bares, pontos públicos de agem e fachadas de edifícios em bairros de Florianópolis – como o “Histórias no Peito” e a homenagem a Antonieta Barros, na rua Tenente Silveira; o mural “M8”, na praça Pio 12; a escadaria que liga as ruas Nereu Ramos e Marechal Guilherme à avenida Prefeito Osmar Cunha –, além de Navegantes (SC), Rio de Janeiro, Porto Alegre, São Paulo, Ribeirão Preto (SP) e Brasília.
Casada com o músico Felipe Nunes, também brasiliense, mas que conheceu aqui, é mãe de Lia (cinco anos) e Cássia (três anos), nascidas na Ilha.
No dia 12 de abril, às 19h, na Helena Fretta Galeria de Arte, Gugie conversará com a plateia sobre a mostra que apresentou em março, no baú de um caminhão, no Centro da cidade.
Como foi o teu o a o na arte?
Eu cresci sendo parceira do meu pai de visitar museu. Além de ser militar da Aeronáutica, também se formou na UNB (Universidade de Brasília), em artes plásticas.
Na época, não entendia como aquilo me influenciava, mas o cheiro da tinta, os quadrinhos que eu pintava e os desenhos que fazia, com certeza, me influenciaram. Ele é minha primeira referência. Mas lembro da minha mãe me ensinando a desenhar um sapato.
Com 13 anos, comecei a dançar danças urbanas. Logo entrei para companhia de dança de Garopaba. Por meio da companhia, conheci o hip-hop e encontrei nessa cultura um espaço criativo e de celebração.
Com 18, comecei a grafitar e nunca mais parei de usar spray. Nesta mesma época, entrei para Udesc, onde fiz bacharelado em artes visuais. Aí entendi aos poucos que a arte poderia vir a ser minha profissão.
Ainda assim, busquei em cursos, formações e preciosos diálogos com pessoas que iro para entender que caminho levar. Mas sobre tudo a confiança no meu trabalho foi o o mais importante que dei na minha carreira.

Que tipos de superfície já coloriste? Qual foi a mais inusitada?
Nossa, já pintei muito muro, muita porta de ferro, container, caminhão e pinto tela desde criança. Mas acredito que prédio é o mais fascinante. Uma vez pintei uma parede muito alta, numa subida de morro, com andaime, foi o mais desafiador até hoje. Recentemente, minhas telas estiveram expostas dentro de um caminhão de mudanças, acho inusitado também esta instalação das obras.
Quando alguém te contrata, como é o processo de definição do tema e a concepção do projeto?
Bom, agora estou sendo agenciada pela Aborda, uma produtora do Rio. A Carol [Carolina Herszenhut] recebe meus clientes, mas o procedimento é o mesmo: mandar foto da parede, tamanho e se tem alguma ideia de tema, sempre apontando para meu estilo de trabalho, as cores da minha identidade.
E para minhas telas a Helena Fretta é quem me representa. Basta entrar em contato com galeria também. Assim, podemos entender como atender ou apresentar as obras que estão no acervo.
E se alguém te oferece uma parede para livre criação? Como definir o que sairá ali?
Eu venho do grafite, e tenho profundo respeito pela cultura. Normalmente, quando alguém cede a parede, eu explico sobre meu trabalho de muralista no qual podemos pensar juntos, e tem um investimento ou, dependendo da parede, posso propor um mural coletivo de grafite, chamo outros amigos para compor junto.
Então, eu defino o que vou pintar quando tenho liberdade assim, adequando minha pesquisa ao espaço. Eu acredito que o muro pede, e tenho a sensibilidade de pensar nas pessoas que vivenciam nesta rua, nesse lugar, crio relações.

A tua casa também é colorida?
Hahaha! Sim! Não com desenhos, mas eu pintei as paredes e tetos coloridos, trazendo as sensações que gosto para cada ambiente. Tenho orgulho.
A mulher é um tema recorrente em teus trabalhos.
Sim, acho que ocupar é uma forma de luta, naturalizar nos nossos imaginários a presença das mulheres, negras principalmente, de forma diversificada, natural. Ultimamente, tenho ampliado as imagens de forma que possamos apreciar os detalhes das expressões.
A exposição que recém-apresentaste, em março, foi dentro do baú de um caminhão. Como veio esta ideia?
Surgiu da minha convivência com a cidade, ao ver os caminhões parados. Também tem a relação de que já me mudei muito. Acredito que, poeticamente, eu despertei para um caminhão de mudança numa aula de curadoria artística que fiz da Kamilla Nunes.
Ela nos apresentou o Museu de Arte Moderna Departamento das Águias, criação de Marcel Broodthaers, e na abertura do museu aparecia ali o caminhão de mudanças, no fundo de uma fotografia (se não estou enganada). Mas guardei essa referência junto a minha vivência e construí esse projeto.

Qual foi a mensagem desta mostra?
Que a gente repense o gostar sobre as mulheres, como estamos nos relacionando com elas enquanto sociedade. Trouxe meus afetos de uma forma que provocasse cada visitante a pensar nos seus próprios afetos.
Participaste de concursos, salões ou eventos com premiação?
Ao longo da minha carreira participei de muitos eventos, mas, recentemente, durante a pandemia, é que estou aprendendo e buscando junto com parceiros a me inscrever em salões e editais culturais. Tive bons resultados. Ganhei o Prêmio Trajetória, o Elizabete Anderle e também o 3° Salão de Artes Visuais de Navegantes.
Na cobertura de um grande mural, o que é mais trabalhoso?
Acredito que a pré-produção é o mais trabalhoso. Como sou mãe, e esses murais demandam muito de nós, eu acabei otimizando a parte braçal da pintura para que não estenda por muito tempo.
Qual foi o maior mural que fizeste?
O maior que eu fiz foi o “Histórias no Peito”, mais de 600 metros quadrados. Levamos nove dias. Sabe que não sei qual demorou mais?!

as muitas horas nas alturas, pintando. O que sempre levas contigo?
Levo barra de cereal, água e música. Não pode faltar música. Me preparo antes com protetor solar, roupa confortável, me alimento bem e fico muitas horas pintando. Paro apenas pro sol do meio dia, chuva forte ou vendo forte.
Amarelo, roxo e lilás são cores bastante presentes no teu trabalho. Por quê?
Acho que elas harmonizam muito bem com a forma que penso as cores. O calor, as sensações, além de um conforto.
