A Prefeitura de Florianópolis tem audiência marcada com a 4ª Câmara de Direito Público na próxima segunda-feira (6) para defender a idade mínima de 4 meses para o ingresso de bebês em creches municipais e a manutenção do critério socioeconômico, que prioriza a distribuição das vagas – regras em vigor atualmente.
As normas são questionadas pelo promotor de Justiça do MPSC (Ministério Público de Santa Catarina), Júlio César Mafra. Na prática, o promotor pleiteia que o município permita o ingresso de todos os bebês a partir do nascimento cujos pais procurem as creches municipais, sem distinção de renda ou faixa etária.

Atualmente apenas bebês a partir de 4 meses ingressam nas creches de Florianópolis. A idade é semelhante ao período mínimo previsto em lei, em todo o Brasil, para a licença-maternidade das mães (há locais que concedem dois meses a mais, somando seis meses de afastamento).
Levantamento realizado pela prefeitura de Florianópolis mostra que apenas três capitais brasileiras – dentre elas Florianópolis – permitem matrícula de bebês nessa faixa etária. A maioria têm como idade de corte os seis meses. Em Macapá, no Amapá, é apenas a partir do primeiro ano de vida.
O caso tramita na Justiça desde 2016. Em 2019, o juiz Ruy Fernando Falk, da Vara da Infância e da Juventude, decidiu a favor da prefeitura, entendendo que o critério socioeconômico é necessário diante da falta de vagas e que há “grande risco de contágio de doenças de crianças nesta fase da vida, caso expostas a ambientes relativamente confinados como o de uma creche”.
O Ministério Público, então, entrou com recurso e o caso ou a tramitar em segunda instância. A 4ª Câmara de Direito Público determinou que a prefeitura de Florianópolis levasse técnicos da Saúde que expliquem as razões para manter a faixa etária mínima.
Para Mafra, a ampliação é necessária para garantir a “universalização da educação”, meta prevista pelo PNE (Plano Nacional da Educação), programa estabelecido pelo Governo Federal. Ele também afirma que há casos no qual a licença-maternidade começa no último mês de gestação, e não no primeiro mês de vida da criança, o que prejudicaria as mães. Há também mães em trabalhos informais que não gozam do benefício.
Manter os atuais critérios etários e socioeconômicos “é cercear o o de crianças à educação infantil pública e gratuita”, justifica o promotor. “Não é issível que se faça distinção entre duas crianças com base no critério socioeconômico, deixando de oferecer a uma delas um serviço essencialmente público e que lhe é de direito”, pontua o promotor.
Recém-nascidos estariam em risco, diz secretário 4l2t5u
O critério socioeconômico é fundamental para garantir educação àqueles que não tem condição, argumenta a SME (Secretaria Municipal de Educação). Hoje há 2 mil vagas disponíveis e 55 crianças na fila de espera, isso porque nem todos os pais estão nos bairros com creches que têm vagas. As filas são registradas, principalmente, nos bairros Rio Vermelho e Ingleses.
Conforme a SME, a rede não comportaria todos os bebês residentes no município. Se todas as pessoas de 0 a 5 anos fossem atendidas pelas creches do município, a prefeitura de Florianópolis “comprometeria as demais demandas”, justificou a pasta no processo. A pasta não tem estimativa sobre o custo adicional que seria necessário.
O secretário municipal de Educação, Maurício Fernandes Pereira, afirma que as alterações são incabíveis. Isso porque os bebês recém-nascidos correriam risco de vida em meio aos demais. “Até os quatro meses, as crianças não têm anticorpos e imunidade. O ciclo vacinal se completa apenas aos seis meses. Aos quatro meses, está parcialmente completo”, afirma.
Bebês devem ficar com as mães, ressaltam pediatras 6a4e5i
“As crianças devem permanecer com a mãe no período pós-parto. O aleitamento materno é necessário para evitar problemas ao desenvolvimento cerebral e garantir a proteção imunológica, pois os anticorpos am pelo leite”, explica o pediatra e professor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), José Martins Filho.
Martins Filho reconhece que há muitas mulheres que estão em condição de trabalho informal e não gozam da licença-maternidade. No entanto, ressalta que o esforço deve ser na direção de garantir que essas mães sejam contempladas pelo direito.
“Lutamos para que a licença seja de seis meses, que é o ideal”, ressalta o professor. “Há crianças que acabam não ficando perto da mãe por outros motivos, como falta de conhecimento ou problemas emocionais enfrentados pela mãe. O ideal é que fique perto”, pontua.
A reportagem pediu uma posição sobre o tema para a S (Sociedade Catarinense de Pediatria), mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem. O Sintrasem (Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis) não quis se manifestar sobre o tema.
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A 15ª Promotoria de Justiça da Capital, na qual Mafra é lotado, entrou com a ação civil pública no fim de 2016. Na época, a prefeitura publicou edital de matrícula para o ano de 2017, no qual só poderiam se matricular bebês a partir de quatro meses e as vagas seriam prioritárias às famílias mais pobres, independente da ordem.
Criticando o edital, o promotor alegou que a SME deve “adequar sua atuação, viabilizando a efetivação do direito à educação a todos os que esse serviço buscarem”, tendo “obrigatoriedade de manter a educação infantil, em creche e pré-escola, para crianças de zero até cinco anos de idade”. Após o revés na primeira instância, o promotor recorreu.
A Procuradora de Justiça do MPSC, Gladys Afonso, ou a representar o órgão na nova instância. Ela emitiu parecer em 2019 no qual sugere a manutenção do critério de 4 meses. “Sendo a idade mínima fixada pela Portaria Municipal compatível com o período que, em regra, corresponde à licença-maternidade, aliado aos impactos acarretados à saúde e ao desenvolvimento da criança com o ingresso prematuro no ensino infantil, não há como se afastar o critério etário estabelecido”.
A procuradora, no entanto, pede a reforma da sentença para o aspecto socioeconômico. Segundo ela, manter as atuais regras prejudica famílias “igualmente carente de rendimentos, com idêntica necessidade educacional”. Ela propõe que todas as famílias que comprovem não terem renda para matricular os filhos nas creches privadas tenham vaga garantida na rede municipal.