Você já parou para pensar no que é arte? A pergunta pode ser simples, mas a resposta é complexa. Ligada aos sentimentos e individualidades, é possível criar uma obra com quase tudo, até mesmo com materiais descartáveis. Prova disso são os mosaicos desenvolvidos no projeto Escola do Mar, iniciativa da Secretaria Municipal de Educação de Florianópolis.

Um dos responsáveis pela orientação é o arte-educador Sátiro dos Santos Filho — conhecido como tio Baleia ou mestre Baleia. Entre as produções mais desejadas, os mosaicos estão no topo da lista.
Na Escola Básica Municipal (EBM) Adotiva Liberato Valentim, a cerâmica é o que dá vida ao que é pensado no papel e depois aplicado na prática. Com a participação dos colaboradores, jovens e familiares, a composição começa com a escolha do desenho, plotagem e colocação da tela de garça — ferramenta utilizada na tapeçaria.
Depois, os pisos são cortados no tamanho e formato adequados, tudo para proporcionar o contraste ideal. Os participantes ficam responsáveis pela colagem, selecionando uma peça e encaixando no local correto. A atividade desperta o senso de participação e pertencimento.
“A escola abriu os portões para a comunidade, para fazer parte desse projeto. Temos alguns vizinhos que já vieram, idosos que conhecem a unidade há muito tempo, eles vieram felizes da vida em poder colocar uma pecinha”, conta o diretor da escola, Vilson de Oliveira.
A turma colocou a mão na massa neste ano, mas alguns integrantes lembram das oficinas anteriores, que ocorreram entre 2012 e 2017. Desde lá, a preocupação com o meio ambiente já era uma característica.
“Replicamos a ação que eles devem ter para um mundo melhor. Separar o lixo, fazer uma horta, uma compostagem, todo esse trabalho já está englobado. A gente não fala só de mosaico, falamos de sustentabilidade”, explica o arte-educador Sátiro.
Além da conscientização, existe outro benefício que está sendo observado pelos profissionais: a melhora na concentração. “A criança que a por ali pode chegar de uma forma, mas ela sai bem mais concentrada”, declara a orientadora educacional Maria do Carmo Alves da Rosa. O objetivo é fazer do projeto dos mosaicos algo fixo, com turma e horários definidos.
Com caixa de leite, garrafa pet, latinhas e papelão, os estudantes das escolas básicas e dos núcleos de educação conseguem criar diversos objetos.
Trabalho de gerações q5f4e
Djennyfer Santos, 18, é neta de Sátiro e é ela quem acompanha o avô desde pequena. O envolvimento escolar aconteceu em 2011, quando ingressou na EBM Adotiva Liberato Valentim.
De lá para cá, foram diversos projetos e aulas. “Quando ele vinha trabalhar, eu vinha junto para ajudar ele com as crianças, para incentivá-las”, relata a menina.
A arte e a reciclagem são parceiras antigas e Djennyfer ainda consegue recordar um dos trabalhos mais marcantes.
“Eu lembro que uma vez a gente fez um vaso com uma caixa de leite. Eu fiz toda a minha caixa, em volta, com E.V.A. amarelo e escrevi embaixo ‘vô, vô, vô’. Coloquei um monte de flor e em casa eu fiz um vaso, coloquei a terra, mas eu nunca me esqueci da primeira plantinha que deu.”
Lohan de Lima Sieg, 15, é o novo companheiro da dupla. Um dos responsáveis por separar e numerar as peças que serão coladas, o jovem já tem a confiança de Sátiro, que acredita no potencial do rapaz.
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Para colocar em prática o que foi pensado no papel, existem alguns processos que devem ser seguidos, como a escolha da arte e a produção do desenho que será usado.
No caso da obra que está sendo criada para a EBM da Costeira do Pirajubaé, o artista Luciano Martins foi um dos parceiros. “Criei um desenho baseado no que ele falou, a vista mais linda de Florianópolis”, explica o profissional.
A ilustração foi feita por meio de fotos e registros do bairro, com o objetivo de transmitir, pelos elementos, a singularidade da região.
“É uma arte histórica, porque resgata o que é a Costeira do Pirajubaé”, opina Vilson. Com traços marcantes, todos que fizeram parte do processo vão lembrar da experiência depois que o mosaico for instalado.
O surgimento do mestre Baleia 6t6g5z
O amor pela produção nasceu de forma inusitada, entre os anos de 1998 e 1999. “Eu trabalhava com obras e fui trabalhar em uma que a pessoa fazia mosaicos. Quando eu olhei, que lindo que é, mas não deixavam nem chegar perto”, conta o arte-educador Sátiro dos Santos Filho.
As primeiras composições foram montadas com sobras de cerâmica, replicando quadros do Avaí Futebol Clube e Figueirense Futebol Clube.
Nas primeiras entregas, quando alguém reclamava, o artista refazia a colagem, sempre em busca do melhor resultado, e a preocupação permanece até hoje.
A neta Djennyfer Santos conta que o artista fica no ateliê, no último andar da casa, por muitas horas. “Às vezes, ele desce, come, com a boca cheia e já sobe. Ele não sai até terminar.”
Mais de 2000 crianças já aprenderam as técnicas para replicar os mosaicos. “Eu poderia estar feliz só por fazer, mas estou superfeliz por poder ensinar”, expõe Sátiro, que é uma referência para os jovens do Morro do Mocotó, comunidade onde cresceu.