Descendente de Tiradentes, a mineira Luciana Xavier Sans de Carvalho, 40 anos, está radicada com a família em Santa Catarina desde 2006, onde luta pela melhora das condições de trabalho e pela diminuição de acidentes nas empresas. Depois de atuar durante oito anos como auditora fiscal do trabalho do Ministério do Trabalho em ville, Luciana assumiu há dois anos a função de chefe do Segur (Setor de Saúde e Segurança do Trabalho da SRTE/SC (Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Santa Catarina), em Florianópolis.
Sempre animada e com um senso crítico apurado, Luciana acredita que a resolução dos problemas nos ambientes de trabalho e o aumento da segurança para os trabalhadores no Estado a pela união de forças. Afinal, ela defende, um acidente de trabalho – SC teve 20.879 em 2015, sendo 3.967 envolvendo máquinas e equipamentos – não é bom nem para o empresário, nem para o trabalhador e a sua família e nem para a sociedade.
Mesmo sabendo que ainda é preciso avançar com o tema em SC, Luciana afirma que o Estado já serve como exemplo para outras iniciativas no país quando o tema é a NR-12 (Norma Regulamentadora nº 12). A SRTE/SC, em conjunto com outros órgãos como a Receita Federal e entidades como a Fiesc e sindicatos de máquinas e equipamentos tem sido referência em iniciativas para melhorar os equipamentos e máquinas fabricados no Estado e aqueles importados que chegam nos portos de SC. “Para a minha alegria, eu nunca recebi um não de um parceiro em SC. O terreno aqui é muito fértil”, avalia Luciana, mãe da catarinense Malu, de seis anos. Confira, a seguir, a entrevista feita com ela na sede da SRTE/SC.

Alessandra Ogeda – Este ano o MTE alterou o procedimento de fiscalização da NR-12, norma que criou polêmica entre os empresários nos últimos anos. Por que houve esta revisão?
Luciana Xavier Sans de Carvalho – A NR-12 foi constituída de forma tripartite depois de dois anos de discussão e aprovada de forma consensual a alteração dos 40 itens para os 340 itens (de fiscalização). Mesmo com esta alteração e ados seis anos dela, que foi feita em 2010, ainda a gente encontrou muita pressão do empresariado no sentido de poder ter ainda, além de todo esse prazo, ainda um prazo a mais. Então foi feito o procedimento especial de fiscalização agora. O auditor fiscal, em uma auditoria comum, obrigatoriamente se ele ver uma situação de descumprimento da legislação, ele tem que autuar. As exceções são as únicas previstas no critério para a dupla visita, ou seja, empresas com menos de 10 trabalhadores, alteração na legislação inferior a 90 dias ou constituição daquela empresa com data inferior a 90 dias. Se a empresa não se enquadrar nestes três critérios da dupla visita e havendo uma inconformidade em relação à legislação, o auditor por obrigação funcional e legal tem que atuar. Então esse procedimento vem no intuito, primeiro, de trazer oportunidade em relação à NR-12 para essa dupla notificação.
Alessandra Ogeda – Todas as empresas estão sendo enquadradas neste critério da dupla notificação?
Luciana Xavier Sans de Carvalho – É como se fosse aplicado o critério para a dupla visita em geral em tudo que for relacionado à NR-12. E nessa situação ficou, a critério do próprio auditor fiscal responsável pela ação fiscal conceder um prazo maior para adequações que as máquinas precisem de até um ano. E esse um ano ainda assim pode ser elastecido desde que seja comunicado à chefia, haja uma averiguação das questões financeiras ou técnicas que exijam a concessão de um prazo ainda superior a esse um ano. Agora, é bastante importante ressaltar que situações de risco grave e iminente, estas que amputam, elas estão fora deste procedimento especial de fiscalização.
Alessandra Ogeda – Por que após tantos anos de mudança na NR-12 ainda alguns empresários têm dificuldade de cumprir a norma? É pela complexidade dela ou por causa do hábito de deixar tudo para a última hora e ainda tentar ganhar tempo para fazer as adequações?
Luciana Xavier Sans de Carvalho – Tem um pouco da questão cultural e um pouco de dificuldades técnicas também. Isso porque a NR-12 anterior, que tinha 40 itens, ela praticamente já abrangia os 340 (itens que aram a ser fiscalizados após a mudança). Ela falava que a máquina tinha que ter proteções adequadas. E por adequado, deixava um leque amplo para o profissional legalmente habilitado, os engenheiros, pensarem com as suas convicções técnicas e a sua criatividade também em soluções que tornassem aquela máquina segura e, além disso, ainda produtiva. Em países em que a cultura é um pouco diferente… porque a gente via algumas empresas nesse “adequado” (no Brasil) colocando pedaço de isopor, colocando quase o chiclete do McGyver ali…
Alessandra Ogeda – Ou seja, ficava à critério da empresa dizer o que seria adequado?
Luciana Xavier Sans de Carvalho – Isso. Poucas questões eram esmiuçadas nestes 40 itens, mas deixava a critério do profissional legalmente habilitado e contratado pela empresa para decidir a melhor forma.
Alessandra Ogeda – Então se esse profissional apontava uma saída estapafúrdia para o problema, a fiscalização tinha que aceitar aquela medida?
Luciana Xavier Sans de Carvalho – Não é que a fiscalização tinha que aceitar, mas a empresa criava uma expectativa que aquela solução dada estava de acordo com a norma. Porque a norma diz adequada e diz que a empresa tinha que contratar um profissional legalmente habilitado, um engenheiro, e ele vem, presta o serviço, recolhe a anotação de responsabilidade técnica, o que qualquer empresário naturalmente, principalmente mais leigo, entende? Eu estou em conformidade. Aí vinha a fiscalização e falava “Não, apesar da anotação de responsabilidade técnica ter sido feita por um engenheiro, essa solução apresentada por ele não garante a segurança para os trabalhadores”. Então essa alteração da norma dos 40 para os 340 (itens) foi muito uma demanda do próprio empresariado. Eles falaram “Olha, esses conceitos muito amplos, muito abertos, são subjetivos. Nós queremos objetivar para trazer a segurança jurídica” e que, agora, está sendo utilizada de outra forma. Então o pedido era que a norma fosse mais clara. Mais objetiva. Alguns normativos nós já tínhamos, como convenções coletivas de trabalho, instruções normativas do ministério que diziam um pouco mais sobre o que seria este adequado. Mas ainda em documentos esparsos.
Alessandra Ogeda – Então a revisão da norma o que fez foi reunir tudo isso que já existia de forma esparsa?
Luciana Xavier Sans de Carvalho – Isso. Quis que estes conceitos subjetivos fossem objetivados. Essa comissão criada tanto por empregadores quanto por trabalhadores e por governo foi buscar normativos, inclusive, da União Europeia. Muito da legislação adotado na União Europeia foi repetida aqui para nós. Isso que eu tento fazer os empresários entenderem. Se nós conseguirmos adequar eles à NR-12 no Brasil, eles vão produzir para o seu mercado próprio máquinas seguras e ele vai competir no Exterior com empresas para vender o seu maquinário, e Santa Catarina é um grande fabricante de máquinas, lá fora. E não vai permitir, porque aí a norma no Brasil serve para todos, que empresas de outros países, e aí eu vou citar a China só porque é um grande exportador de máquinas, chegue aqui sem proteção e que vá competir com a nossa máquina e que vai acidentar o nosso empregado. Então um pouco eu acredito que foi, como a gente disse, uma questão cultural. Então esperaram a norma, e ela própria já trouxe prazo de até 60 meses, e esperaram isso tudo para falar algo. Aí a gente entra na questão técnica. Se a norma estivesse sido abraçada como a gente esperaria desde o início, e esse tipo de comunicação, esse canal tripartite fosse replicado nos Estados e funcionasse, era para a gente estar azeitando este relacionamento e a norma ser cumprida.
Alessandra Ogeda – Se isso tivesse acontecido, todos estariam afinados no mesmo discurso. Mas não foi isso que aconteceu, não é mesmo?
Luciana Xavier Sans de Carvalho – Não foi isso que aconteceu. E quando falam comigo, e eu fico bem brava, quando dizem assim “Ah, mas a norma aqui faz com que a máquina alemã não conseguiria estar adequada”. Eu falo “Isso é uma grande inverdade”. Porque uma grande montadora alemã (a BMW) foi para ville e à época eu era auditora em ville e como eu falo inglês, eu fui responsável por fazer o contato com eles, e a primeira coisa que me chamou a atenção: em muitas empresas e em grandes empresas do Brasil, quando o auditor chega ele é recebido pelo estagiário, sem desmerecer os estagiários, ele é recebido pelo chefe de RH. E não, por esta montadora eu fui recebida pela engenheira de segurança, pelo médico do trabalho, pelo gerente da BMW no Brasil. Eles vieram, conversaram conosco dois anos antes de iniciarem os trabalhos. Então eles pegaram a NR-12 e a engenheira de segurança deles, brilhante, a Natalie Stefel, me disse “A Alemanha já pode fazer o caminho inverso ao de vocês. Porque a gente teve essa necessidade também, de deixar os conceitos de forma mais objetiva, mas o profissional legalmente habilitado e as empresas já tem uma maturidade e um conhecimento que se eu tirar isso tudo e colocar adequado, o que eu vou ver lá é o adequado”.
Alessandra Ogeda – O que ela quis te dizer é que a NR-12 do Brasil está totalmente adequada ao que eles exigem das fabricantes de máquinas na Alemanha?
Luciana Xavier Sans de Carvalho – Sim. Exatamente. A única questão que essa engenheira me disse que ela via de forma diferente em relação à regulamentação dela, mas que ela entendeu um conceito da criatividade local nossa e bastante interessante para a segurança é que a proteção de máquinas lá, quando exige o bimanual, exige a cortina de luz. Então é uma cortina que se você for chegar perto da zona perigosa, a máquina para. Ela mostra que você está entrando na zona de perigo e a máquina para. E além desta cortina, tem que ter o bimanual, então a sua mão vai estar no local certo para a produção e quando na Alemanha isso não é necessário, porque lá você pode ter um ou o outro e não os dois (controles de segurança). Mas ela disse que eles entendiam que esta é uma medida que fortalece a segurança e eles aplicariam. Até foi dito por um representante do setor empresarial “Ah, mas você já viu as máquinas tais de tal montadora"});// Remover os listeners após a execução document.removeEventListener('click', loadTaboolaConfig);document.removeEventListener('touchstart', loadTaboolaConfig);document.removeEventListener('mousemove', loadTaboolaConfig);document.removeEventListener('keydown', loadTaboolaConfig);}document.addEventListener('click', loadTaboolaConfig);document.addEventListener('touchstart', loadTaboolaConfig);document.addEventListener('mousemove', loadTaboolaConfig);document.addEventListener('keydown', loadTaboolaConfig);});