Pelé é pra sempre
Eu nunca vi Pelé jogar. Ao vivo e a cores, infelizmente não tive a oportunidade. Nas quatro vezes que o Rei visitou Santa Catarina, eu ainda não era nascido. Tenho sim boas lembranças de tardes de domingo nos anos 80, com jogos da Seleção Brasileira de Masters, a narração de Luciano do Valle e claro, os lances, os es e os gols do maior jogador da história.
A Seleção Masters era repleta de craques, que pareciam “normais” diante da genialidade do Rei. Em uma dessas tardes de Brasil x Chile, a “luz acabou” aqui em casa justamente em um ataque verde e amarelo. Foram segundos de nervosismo e minutos de apreensão, sem saber como tinha sido o desfecho da jogada.

Quando a energia retornou, a imagem na televisão já mostrava Pelé correndo em direção aos companheiros, pegando impulso para saltar e socar o ar, antes de partir para o abraço. Nem o gol na tv eu consegui assistir. O destino me mostrou o replay e questionei minha paixão pelo Rei.
Naquele dia perguntei pro meu pai, hoje apelidado de Vô Gegé, na época Rogério Cabral, a razão de Pelé ter se aposentado tão cedo. A reposta foi esclarecedora: “Ele escolheu parar de jogar no auge”, disse Dr. Rogério. Entendi na hora essa interessante escolha. Pelé é pra sempre.
Hoje é fácil recuperar todas essas imagens na internet e entender que a cobrança de falta de Cristiano Ronaldo, o elástico do Romário, o drible do Neymar, a arrancada veloz de Mbappé, o faro de gols de Harry Kane, o oportunismo de Soares, a mágica de Maradona (menos o gol ‘de mão’), o brilhantismo de Messi e tantos outros capítulos do Futebol, foram escritos em décadas adas pelo Rei. Até o gol que ele não fez, aquele do meio de campo, ficou famoso.
Pelé virou adjetivo. “Aquele lá é o Pelé das artes plásticas; esse piloto é o Pelé do automobilismo; ali está o Pelé do marketing”. Sem dúvida, o mais famoso brasileiro de todos os tempos. Em qualquer canto do mundo, Pelé e Futebol se confundem e me confundem até hoje. Pelé era mesmo de Três Corações ou de outro planeta? Galáxia? Talvez. Sua presença no antigo Zaire, hoje o Congo, parou uma guerra.
A cena é essa: Crianças jogando bola em um campinho de terra na África do Sul, questionados por um repórter sobre o Brasil, com certeza alguém falaria “Pelê”, assim com um sotaque diferente, em uma referência a majestade.
Cena 2: Nas ruas do Japão, um grupo de adolescentes no centro de Tóquio, respondendo sobre o Brasil? “Ronaldênho”, “Naimar”, “Zico” e “Pelé”, pode apostar.
Cena 3: Copa dos Estados Unidos, 1994. Pelé era mais reconhecido pelos norte-americanos do que a própria Seleção Brasileira e a Seleção dos EUA.
Pelé defendia o número de 1283 gols marcados na carreira. A FIFA não reconhece alguns, os goleiros adversários, todos. Andrada, goleiro do Vasco, foi vencido no gol 1000, até hoje é citado quando essa marca é lembrada. O Rei era/é tão gigante, que quem não defendeu a cobrança, também brilha.
Pelé adorava música, cantar e tocar violão. Gravou discos e fez muitas parcerias. O Rei tinha uma veia de ator também. Participou de filmes e programas na tv. Na música e no cinema não era aquele craque como nos gramados, mas não ‘comprometia o time’, fazia o básico para não sair derrotado. Embalou tardes, churrascos e bailes.
Camisa 10, bicampeão mundial com o Santos, tricampeão com a Seleção, ídolo, ministro e Rei. Não necessariamente nessa ordem. Jogou, cantou, atuou, reinou e se virou com problemas na vida pessoal, que ganharam destaque na mídia, como tudo o que Pelé fazia e falava. Pelé tinha dias de plebeu também.
Se um novo Pelé vai surgir nos gramados? Difícil cravar. Se um novo Pelé vai surgir na história do Futebol? Nunca mais. A quinta-feira foi marcante para muitos de nós. Foi o ‘Barata’, nosso cinegrafista da NDTV, que conferiu o smartphone no intervalo de uma gravação e me ou a triste notícia.
Melancólico assim, pelo futebol eu fiquei só no dia do 7 x 1. Hoje a dor da goleada, foi bem maior. Parafraseando os Racionais Mc’s, do santista Mano Brown e usando uma licença poética: “A lágrima de um homem vai cair. Esse é o seu B.O. pra eternidade. Diz que homem não chora, Tá bom, falou. Não vai pra grupo irmão, aí, o ‘Rei’ chorou!”. Foi de alegria.