Há pouco menos de 24 anos, nasciam Yuri Alexandre e Yan Guilherme – da mesma mãe e no mesmo horário. Gêmeos, muito mais do que os poucos minutos entre um parto e outro diferem os irmãos: humanas e exatas, azul e verde, Avaí e Figueirense.
Ambos nasceram, no entanto, em Balneário Camboriú – pois na época Itapema, cidade em que a família morava, não tinha maternidade. Os dois também descobriram relativamente tarde a paixão pelo futebol – seguindo os os dos pais, cada qual à própria forma.
Yan, o pai, o Setor D e o Avaí 5t3u4g
Para Yan, a semente azurra estava em forma de tatuagem no braço do pai – o escudo do Avaí, imponente, exibido no ombro. Natural de Palhoça, seu Antônio Carlos Teixeira pegou fases de ouro do Leão da Ilha.
A partir das lentes dos olhos do pai, o filho ouviu histórias do antigo Adolfo Konder e da inauguração da Ressacada. Mas a derradeira, para o filho, veio em 2009.

“O que eu lembro de 2009 foi a partida contra o Flamengo. Meu pai ficou eufórico. Eu olhei aquilo e pensei: ‘cara, eu quero me sentir assim também’. Sempre que meu pai assistia na TV, eu ia correndo e via também”, contou.
Naquele ano, o Leão colocou 3 a 0 no Flamengo numa Ressacada lotada. Na época pequeno, Yan lembra de comemorar ao lado do pai os gols de Luís Ricardo, Léo Gago e Fabinho Capixaba.
Fora o 11º jogo de invencibilidade do esquadrão azurra – que, com a vitória, se colocava no G-4 do Brasileirão daquele ano. O Rubro-Negro acabaria campeão – mas não antes de ouvir o “olé” ecoando nas arquibancadas em Florianópolis.
Yan diz, no entanto, que a memória mais afetiva veio mais para frente, também pela presença do pai nas cadeiras azuis do setor D da Ressacada.
Foi em 2021, no último o do Leão da Ilha para a Série A. Do alto das arquibancadas, um grupo de 20 amigos acompanhava o pai e filho e todos presenciaram, em baque, o pênalti perdido por Edilson aos 32’ da segunda etapa. Todos, igualmente, morderam as unhas quando o árbitro viu invasão na área avaiana e mandou voltar a cobrança.
Mas o estouro ainda estava por vir. “No último gol, do Renato, lembro de abraçar meu pai e meu pai estar chorando em cima de mim, copiosamente. Estava em 20 amigos, e todos abraçaram meu pai”, lembra, sorrindo.
Yuri, a mãe, a Coloninha e o Figueirense 6y6s12
Se por um lado o irmão acolheu o Avaí por causa do pai, Yuri pegou o caminho contrário. Por influência da mãe, Itamara Gonzaga Teixeira, e o costume dela de vestir os gêmeos com cores diferentes – talvez para facilitar o reconhecimento, acabou moldando, mesmo sem querer, a herança alvinegra para o filho “caçula”.

“Sempre fizemos tudo juntos, temos a mesma genética. E para fazer algo junto, a gente rivalizava. Jogando xadrez ou videogame, cada um tinha que estar de um lado. Isso contribuiu. Minha mãe sempre vestiu os gêmeos diferentes, ele de azul e branco, e eu de verde. Consequentemente, como o Figueira tinha o verde, uma coisa leva à outra”, disse.
O sangue alvinegro puxado da mãe tem raízes nos arredores do estádio Orlando Scarpelli.
Criada na Coloninha, dona Itamara desde cedo contava histórias sobre catracas puladas para ver o Figueirense jogar, sobre os carnavais pulados na escola de samba do bairro, e sobre um jogo em específico de um time amador de Palhoça no Scarpelli.
O goleiro era um certo Antônio Carlos – e com ele o clima havia batido. “Se viram, se falaram e se gostaram”, diz Yuri. E o resto é história.
Todo esse borbulhão mexeu com o jovem. A certeza de que era o caminho preto e branco que ele queria para a vida veio, no entanto, em 2012 – ironicamente.

O Figueirense perdeu o caneco do Estadual daquele ano justamente para o Avaí – com imponentes 5 a 1 no agregado.
“A primeira grande memória de futebol que eu tenho é 2012, infelizmente. Mas foi o momento em que eu descobri que era Figueirense. O Avaí ganhou o campeonato, e aquilo me doeu. Foi aí que eu soube”.
Mas foi a mãe, muito mais tarde, que o advogado teve a memória mais benquista em relação ao Furacão. Para fazer justiça, nas palavras de Yuri:
“A lembrança mais forte foi a minha mãe, mas não com o que o Figueirense fez em campo. A minha mãe tinha acabado de sair do pior estágio do câncer. E ela pede para ir ao jogo comigo. Ela nunca tinha ido ao Scarpelli depois de velha. Fazia muitos anos. Ela carequinha, com o lenço na cabeça. E lembro dela pedir pra gente ir. A gente vai e ela ficou sentada. Eu não fico sentado”, relembra.
“Mas fiquei sentado ao lado dela o jogo todo. Porque eu tinha muito medo de não poder ter essa lembrança da minha mãe. Por tudo, essa é a lembrança mais forte que eu tenho. Ela estava rindo muito, muito feliz com tudo. Lembro de olhar minha mãe daquele jeito e pensar que não precisava de mais nada. Não queria saber de mais nada. Só de que aqueles 90 minutos durassem o tempo que tivessem que durar”, completa.
Entre amizade e rivalidade 6525p
Dentro de casa, são outros dois avaianos e outros dois alvinegros. Ambos afirmam que é impossível acompanhar o clássico juntos “apesar de quererem muito” – é um momento de euforia, lazer e descontração para cada um.
De forma que até a esposa de Yan, torcedora fanática do Figueirense, acompanha a partida distante, no próprio setor, na própria torcida.

Mas a rivalidade não torna ninguém inimigo. Pelo contrário: o entendimento de que tudo fica nas quatro linhas foi ado desde sempre dentro de casa.
“Eu não me lembro do meu pai falar do Figueirense de jeito pejorativo. Nunca teve isso. Meu pai nunca teve essa rivalidade, nunca viu o futebol desse jeito. Isso se criou muito mais pela ‘rivalidade’ de dois irmãos” afirma Yuri.
“Ia ser muito legal se meu irmão fosse comigo na Ressacada. Mas não tem como. Ao mesmo tempo que eu queria muito que ele fosse avaiano, eu queria que ele não fosse. Porque eu gosto muito de, quando o Figueirense caiu para a Série C, por exemplo, foi a melhor sensação da minha vida”, completa Yan.
A máxima se aplicou no o do Avaí em 2014 – em partida contra o Vasco da Gama.
“Já me peguei, um dia, no jogo contra o Vasco, em 2014, no o do Avaí, assistindo o jogo com eles e me lembro da narração com o ‘é gol do Santa Cruz’; meu pai alucinado, meu irmão chorando. Eu pensei: ‘caraca, muito f…! Apesar de eu querer que o Avaí se lasque’”, diz o alvinegro.

Assim os irmãos, cada qual a sua maneira, externalizam a paixão pelo próprio clube. Yan coleciona camisas e as divulga na página Vestindo Avaí – contando a história dos mantos usados pelo Leão ao longo dos anos.
Por vez, Yuri possui o podcast Bancada Alvinegra, que entra dia e sai dia, debate os principais fatos do Furacão do Estreito.
Ambos se preparam e já aquecem para o clássico deste sábado (17), no Orlando Scarpelli – que vai movimentar, outra vez, o Estado de Santa Catarina e nossa Florianópolis.