Depois de tentar barrar o andamento da construção da nova ponte da Lagoa da Conceição, pedir a suspensão da tramitação do Plano Diretor na Câmara de Vereadores, solicitar a demolição da estrutura do canal da Barra da Lagoa, e a operação dos beach clubs em Jurerê, o MPF (Ministério Público Federal) atua em mais um caso com posicionamento contrário aos anseios da população de Florianópolis.
Desta vez, acionou a Justiça Federal, baseado num pedido antigo da Ajin (Associação de Proprietários e Moradores de Jurerê Internacional), para remover as quadras esportivas de Jurerê, que existem há 17 anos. A associação nega e sustenta que é a favor da manutenção das quadras. Resultado: comunidade revoltada e temendo perder uma das suas principais áreas de lazer na praia. Atendendo ao pleito do MPF, a Justiça Federal decidiu pela remoção da estrutura em um prazo de 30 dias. O município vai recorrer da decisão.

Ambulante na praia de Jurerê, Vitor Borges, 19 anos, costuma aproveitar os dias e momentos de folga para jogar futevôlei com os amigos nas quadras de areia.
“Aqui é nosso meio de lazer. Sempre que pode a gente vem. É um espaço importante. Não sabia da decisão da remoção, mas é um absurdo, porque é o meio de lazer do pessoal. É um erro o que estão fazendo”, disse Borges. Segundo ele, sobretudo nos fins de semana, as quadras lotam, tanto por praticantes de beach tennis quanto de futevôlei e vôlei.
Presidente da associação Avante Jurerê, Marcelo Cavaggi comentou a surpresa da comunidade de Jurerê diante da determinação judicial.
“Quando a decisão foi divulgada, na quinta-feira, fomos pegos de surpresa. As quadras trazem um benefício público. A própria comunidade criou, cada um trouxe seu esforço físico e financeiro, com contribuição espontânea”, lembrou Cavaggi.
As primeiras quadras no local foram construídas em 2006, para vôlei. Depois, em 2008, as quadras de beach tennis. Hoje, o local tem cinco quadras, sendo duas para vôlei e três para beach tennis e futevôlei.
“É um espaço democrático. De lazer para moradores, turistas, quem quiser vir e praticar esportes pode vir, não tem hora, é só querer se divertir”, afirmou o líder comunitário.
Neste sábado, às 9h, os moradores do bairro farão uma manifestação para contestar a decisão judicial.
“Esperamos que não chova para enchermos as quadras aqui e mostrar ao MPF que, se fecharem as quadras, será uma decisão contrária à vontade da população, dos moradores e de todos os envolvidos no turismo de Jurerê”, salientou o presidente da Associação Avante Jurerê. Segundo ele, a maioria dos moradores de Jurerê quer a permanência das quadras.

“Se não todos, 99,99% são a favor. Eu não conheço ninguém contra. Se os moradores querem, por que acabar?”, questiona Cavaggi.
“Quem toma essas decisões deveria, primeiramente, consultar a população. Convido que venham visitar as quadras, considerando que ainda temos um mês. Visitem e vejam como agrega ao bairro”.
Interesse dos moradores de Jurerê prevaleceu sobre interesse público, criticou juiz e5v3v
A Justiça Federal determinou a retirada das quadras porque teriam sido indevidamente instaladas em área de restinga. Além da remoção das estruturas das arenas, o juiz Marcelo Krás Borges determinou a recuperação integral do espaço.
A sentença da 6ª Vara Federal de Florianópolis foi proferida há mais de uma semana, em 21 de setembro, atendendo ao pedido do MPF numa ação civil pública contra a União e o município, considerados responsáveis por omissão.
O juiz entendeu que o ente federal “poderia ter exercido seu poder de polícia, pois está sendo ocupada uma área de uso comum do povo sem autorização da SPU [Superintendência do Patrimônio da União]”. Para o magistrado, o poder público municipal também tem a obrigação de ordenar o espaço urbano e deveria “ter evitado a invasão de um bem de uso comum do povo”.

De acordo com a sentença, deveria ter sido realizado o licenciamento ambiental para verificar o interesse público e definir a melhor localização para eventual instalação do equipamento. “Na prática, ocorreu que os particulares que moram no local é que destruíram a restinga e construíram a quadra de esportes; assim, o interesse privado dos moradores locais prevaleceu sobre o interesse público, o que é reprovável”.
A decisão estabelece ainda que deve ser apresentado um Prad (Plano de Recuperação de Área Degradada), a ser aprovado pela assessoria pericial do MPF e pela Floram (Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis), para “evitar controvérsia na fase da execução judicial”. Após a decisão da Justiça Federal, cabe ao município recorrer ao TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).
Ajin alega que nunca foi contrária às quadras esportivas 1k5z5q
Mencionada na decisão do juiz Krás Borges como entidade que teria denunciado a suposta irregularidade, a Ajin nega ser contrária à manutenção das quadras em Jurerê. A entidade acaba de trocar de gestão, agora com Luiz Carlos Zucco na presidência. Ele diz, entretanto, que a entidade sempre defendeu as quadras, mesmo no ado.
“Nossa posição sempre foi pela manutenção dessas quadras. Elas existem e são usadas por praticantes de esportes na areia da praia há décadas. Encaminhamos ofícios ao MPF, IMA-SC [Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina] e Habitasul [empreendedora do loteamento], em 2006, 2007 e 2011 nos posicionando fortemente a favor da manutenção dessas áreas”, afirma Zucco.
Conforme o líder comunitário, a denúncia não foi iniciativa da associação e que essa indicação não corresponde com a verdade. “Somos a favor, de forma contundente, em relação à manutenção desse espaço para a prática de esportes. Ele também disse que a Ajin não conhece a sentença, porque não faz parte do processo, nem é parte interessada, e que não vai se manifestar.
“Nosso papel já foi manifestado. O MPF tem ofício nosso manifestando e solicitando a permanência do espaço. É a nossa posição oficial e continua valendo”, pontua o presidente da associação.
Zucco lembrou que a Ajin existe há mais de 30 anos e que a posição sempre foi a de manter o espaço. Disse, entretanto, que se a Justiça entende que as quadras estão em área de preservação, a entidade respeita as decisões judiciais. “Se o juiz assim entendeu, teve os fundamentos, não por nosso impulso, mas que se cumpram as decisões judiciais”.
Ação do MPF é o retrato do caos, afirma secretário de Turismo da cidade 2j693p
Secretário de Turismo, Cultura e Esportes de Florianópolis, Ed Pereira disse, em entrevista à NDTV, que a ação do MPF ocorreu, sim, a pedido da Ajin.
“É uma associação que diz representar o bairro, onde tem minoria de associados e se Deus quiser cada vez menos. Essa ação do MPF, promovida pela Analucia Hartmann, é o caos e mostra o caos que Florianópolis está vivendo. É a mesma procuradora da Ponte da Lagoa, que não deixa desassorear a Lagoa”, disparou Ed.
Na visão do secretário, é difícil entender como que, diante de um equipamento como as quadras de Jurerê, não pode ter prática esportiva na beira do mar.
“Quantas praias têm a reclamação da bolinha batendo em crianças? Aqui há todo um equipamento cercado e cuidado por pessoas que são praticantes”, salientou Ed.
Para o secretário, é hora de dar um basta e entender o que a cidade quer.
“Acredito que o Krás Borges tem a oportunidade de separar seus atos e suas decisões quando são proferidas por entidades que nem sequer mostram um abaixo-assinado de quantos associados de verdade representam”, frisou o secretário.
“A cidade precisa acordar. Essa decisão é o que faz a cidade ficar para trás. Quando não se desenvolve, não tem emprego, nem renda”, completou.
Espaço pequeno não representa ameaça à integridade da praia, segundo biólogo 3e593c
O biólogo e coordenador de meio ambiente da entidade Floripa Sustentável, Emerilson Emerim, lembrou que as praias precisam ser analisadas no contexto do seu uso e que existem praias totalmente resguardadas em unidades de preservação, como Lagoinha do Leste e Naufragados, em Florianópolis, e praias totalmente urbanizadas, como a Praia Central de Balneário Camboriú.
“As praias servem para vários usos, como proteção da zona costeira, uso ecológico, mas também têm uso social e econômico. Em se tratando de uma praia urbana, a praia de Jurerê tem uma série de funções e não pode ser privada da função de lazer”, frisou Emerim.
Ele reiterou que Jurerê foi objeto de um plano de recuperação ambiental e tem uma área recuperada de mais de 70 mil m² de restinga. “Uma quadra de lazer representa um espaço muito pequeno e não se configura como uma ameaça à integridade da praia”, defendeu Emerim.
Além disso, para o biólogo, a decisão de tirar a quadra dos moradores afasta a população da defesa da praia, por indignação. “Quando você fala de recuperação ambiental de praias, não há como imaginar isso sem interação com a comunidade local. E quando você priva a comunidade de uma atividade de lazer, você está indo contra o que a gente entende como uso compartilhado da praia”.
Para o especialista, tirar a quadra e botar a vegetação original não vai ter apoio da comunidade e provavelmente o projeto vai fracassar. “É muito melhor uma gestão compartilhada com a comunidade. A recuperação da praia depende do trabalho integrado com a comunidade”.