Na retomada nesta quinta-feira (2), pelo STF (Supremo Tribunal Federal), do julgamento sobre a demarcação de terras indígenas, os ministros ouviram a manifestação de representantes da CNA (Confederação Nacional da Agricultura) e de outras entidades representativas do agronegócio e dos produtores rurais.
Eles se manifestaram em defesa do marco temporal, tese que condiciona as demarcações de terras indígenas à comprovação de que as comunidades indígenas habitavam a área em 5/10/1988, data de promulgação da Constituição Federal. A sessão será retomada na próxima quarta (8).

O processo trata de uma ação de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, referente à TI (Terra Indígena) Ibirama-Laklãnõ, onde também vivem indígenas Guarani e Kaingang. Centenas de índigenas estão acampados na praça dos Três Poderes, em frente ao STF. Confira o resumo das manifestações.
Segurança jurídica
Rudy Maia Ferraz, em nome da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, afirmou que a defesa do marco temporal não significa a extinção dos direitos indígenas, mas a compatibilização de direitos. Segundo ele, o marco é a única interpretação possível do texto constitucional, pois traz segurança jurídica, balizas e contornos para garantir a implementação das demarcações de terras indígenas ocupadas até a sua promulgação. Trata-se, a seu ver, de um referencial insubstituível para o reconhecimento dos títulos de propriedade.
Para Fernando Filgueiras, procurador do Estado de Santa Catarina, a Constituição Federal assegura o direito aos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam. “Não é à toa que o verbo está no presente do indicativo”, afirmou.
Impacto econômico
Na avaliação de Luiz Fernando Vieira Martins, da Associação Brasileira dos Produtores de Soja, não é crível que pessoas que adquiriram terras de boa-fé e em conformidade com a legislação não tenham direito a indenização, na eventualidade de perderem o domínio em razão de demarcação de terra indígena. Ele ressaltou que o impacto econômico direto e indireto será significativo, tendo em vista que a população atingida depende da atividade agropecuária.
Justa expectativa
Em nome do Sindicato Rural de Antônio João (MS), da Organização Nacional de Garantia ao Direito de Propriedade e do Sindicato Rural de Tacuru (MS), Luana Ruiz Silva de Figueiredo afirmou que a jurisprudência sobre o tema consolida a justa expectativa dos cidadãos, gerando confiança de regularidade dos atos estatais, em especial em relação ao direito de propriedade. Por isso, avaliou que o revolvimento da matéria compreende uma ruptura da estabilidade social, econômica e política do país.
Em nome do Sindicato Rural de Caarapó, Cícero Alves da Costa disse que não é possível aplicar a teoria do indigenato na solução desse julgamento. Para o advogado, não reconhecer o marco temporal e dar provimento ao recurso seria um “acinte” e desrespeitaria a jurisprudência do próprio STF.
Representando o Movimento de Defesa da Propriedade e Dignidade e dos municípios de Cunha Porã e Saudades (SC), Jaqueline Mielke Silva também se manifestou a favor do marco temporal. Segundo ela, os argumentos apresentados até agora não autorizam a reformulação do entendimento do STF fixado no julgamento da Petição (Pet) 3388, que definiu a demarcação da terra indígena de Raposa Serra do Sol (RR).

Proliferação de aldeias
Pelo Sindicato Rural de Porto Seguro (BA), Flávio Roberto dos Santos afirmou que a tese do marco temporal oferece segurança jurídica, enquanto a declaração de sua inconstitucionalidade coloca em risco todas as propriedades rurais do país. Em seu entendimento, o marco temporal evita a proliferação de aldeias apenas para que haja a ampliação do território de determinados povos indígenas.
Laudos ideológicos
Em nome de associações de produtores rurais e pequenos agricultores, Marcos de Souza Boechat observou que, em comparação com outros países, a demarcação de terras no Brasil fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade ao disponibilizar, em média, 239 hectares de terra a cada indígena. Ele também observou que os laudos antropológicos nos procedimentos de demarcação de terra são, em sua maioria, ideológicos e vão de encontro aos direitos dos homens do campo.
Estabilidade
De acordo com Paulo Roberto Kohl, pelo Sindicato Rural de Abelardo Luz, a mesma Constituição Federal que autoriza a demarcação de territórios indígenas, protege a estabilidade das decisões e o cumprimento da função social da propriedade, princípio de direito agrário, além de obrigar o Estado a fomentar e proteger a produção agropecuária do país.
Nesse sentido, Frederico Schulz Buss, da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul, ressaltou que as demarcações não podem ocorrer mediante a violação do direito à propriedade, do direito adquirido, da segurança jurídica e da dignidade de produtores rurais que adquiriram as suas áreas de forma legítima, mansa e pacífica e sem usurpar o direito de quem quer que seja.
Carta em branco
Pela Federação da Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia, Rodrigo de Oliveira Kaufman frisou a necessidade de se respeitar e prestigiar a posição do Legislativo sobre o tema. Não se pode, a seu ver, tratar a matéria como uma carta em branco, na qual caibam interpretações legislativas diferentes de tempos em tempos.
*Com informações do STF.