Toda uma geração de meninas cresceu apaixonada por esporte incentivada pelos pais, mães, irmãos e irmãs que, não raramente, se reuniam na sala para assistir ao futebol nas tardes de domingo ou às corridas de Fórmula 1 que, na década de 1990 tinha um Ayrton Senna apaixonando milhares de pessoas pelo automobilismo.

Eu fui uma dessas meninas. Eu era uma das meninas que ansiava pelos domingos de manhã para vibrar com as voltas rápidas de Senna e emendava nas tardes em que o futebol dominava a televisão, sem nenhum argumento contrário capaz de tirar a bola rolando da tela.
Mas, eu cresci ouvindo homens. Em todos os esportes. Absolutamente todos. Basquete, futsal, futebol, automobilismo. Todas as vozes que entravam no meu ouvido, que me faziam apaixonar cada vez mais por cada um dos esportes eram masculinas. E eu cresci apaixonada pelo esporte, assim como milhares de meninas que se transformaram em mulheres que frequentam pistas, ginásios, estádios. Mulheres que escolheram ser torcida, mas ser parte, trabalhar com e para o esporte. Eu também sou uma delas, dessas que escolheram um caminho de paixão, mas de muita provação.
Provação? Sim. Diariamente, todas as mulheres que vivem o esporte seja à beira de gramados, quadras, pistas, seja dentro de times, clubes, franquias, equipes, todas precisam provar, todos os dias que esse espaço também é nosso, que a nossa voz vai apaixonar as meninas que, em 2022, sentam no chão, grudadas na televisão, para assistir qualquer esporte. Todos os dias nós precisamos provar que é a nossa voz que vai plantar a sementinha plantada em nós anos atrás.
Mas por que precisamos “provar”? O machismo da sociedade está, talvez até mais enraizado, no esporte. Ainda mais quando mulheres se destacam em funções que, enquanto nós crescíamos, eram completamente dominada por homens. Narradoras, comentaristas, repórteres mulheres na década de 1990? Uma raridade. Não porque não houvesse mulheres apaixonadas e competentes, mas porque as portas estavam não só fechadas, mas trancadas.
Mas, é aquela coisa né? Pé na porta e segue em frente. E foi assim que, aos poucos, nós, mulheres, transformamos nossa paixão em profissão, em vida. Não há limites para o talento, a competência, a visibilidade feminina nos esportes.
Nossas meninas, hoje, crescem vendo Mariana Becker entrevistar o melhor piloto de F1 do mundo com uma leveza, naturalidade e com uma condução únicas. Nossas meninas crescem assistindo e ouvindo Alana Ambrósio analisar taticamente e tecnicamente com perfeição uma partida da NBA.
Nossas meninas crescem ouvindo a narração de mulheres como Renata Silveira e Natalia Lara que, assim como nós, cresceram ouvindo os gritos de gol de vozes masculinas e hoje dominam o microfone em partidas decisivas dentro das quatro linhas. Nossas meninas assistem Mariana Spinelli conduzir como poucos um programa de esportes, com leveza, descontração, competência e muito profissionalismo.
E não precisamos ir assim tão longe. Nossas meninas aqui, vilenses, que cresceram indo ao Ernestão, à Arena ville, ao Ivan Rodrigues, ao Centreventos Cau Hansen, cresceram também ouvindo a voz marcante de Danuta Malavolta.
Nossas meninas têm referências, elas enxergam, na tela da TV, nas ondas do rádio, na internet, representatividade. Não são mais as vozes masculinas que entram nas casas e nos fones de ouvido. Não são mais os homens as referências utilizadas nas redes sociais e “coladas” na mente das meninas que são movidas pela paixão. Paixão ao esporte, ao jornalismo.
Nós, mulheres, ocupamos. Ocupamos espaço, ocupamos lugares, arquibancadas, cabines, microfones. Eles nos pertencem, também nos pertencem. E é por eles que continuaremos disseminando a paixão ao esporte, ao jornalismo, ao jornalismo esportivo. Continuaremos sendo referência para as meninas que, assim como nós no ado, sentam na frente da TV para ver e se ver. Hoje elas se enxergam e esse orgulho nós continuaremos carregando. Acostumem-se.