Quem é a estilista que há meio século veste as beldades de Santa Catarina

Conversar com Erica Thiesen, 80 anos, é aprender sobre a vida, o mundo e o comportamento humano; confira a reportagem especial do Floripa 350

A estilista que veste as mulheres mais elegantes de Santa Catarina gosta de usar roupas básicas e, acreditem, vai ao supermercado de sandálias de dedo. Ama o que faz, é de curtir a família, paparica os netos e bisnetos, mas aprecia jogar conversa fora com amigos em um bar. É criativa, arrojada, foge da mesmice e procura ir sempre além do que as clientes pedem. Seja para um casamento, seja para uma festa jovem, leva em conta, acima de tudo, a personalidade das suas clientes. E conversar com Erica Thiesen, 80 anos, é aprender sobre a vida, o mundo, o comportamento humano.

Estilista Erica ThiesenEstilista Erica Thiesen há meio século veste as beldades de Santa Catarina – Foto: Reprodução/Internet/ND

A estilista se diz super fashion, mas não renega os tempos que ou em Ituporanga, sua cidade natal, de onde saiu há 52 anos para se tornar uma das referências da moda no Estado. Fez o curso de pedagogia e foi supervisora educacional, porém nunca abandonou a prática da costura, que vinha de longe. Abriu a butique Fox Trot, que fez história em Florianópolis e funcionava no centro comercial Aderbal Ramos da Silva, o ARS, primeiro – ainda que modesto – shopping da Capital.

“A loja vendia para clientes das principais cidades catarinenses e não fechava aos sábados, porque se tornou um point onde todos se encontravam, num grande burburinho”, conta Erica. Chegou a instalar uma filial no Shopping Itaguaçu, em São José, que durante muito tempo foi o único grande centro comercial da região, mas que demorou para cativar o grande público. Depois disso é que abriu o atelier que mantém ativo até hoje no bairro de Capoeiras, no Continente.

Ela também viveu os tempos gloriosos dos clubes sociais, que atraíam gente de todas as idades para eventos que repercutiam nas famílias e nas colunas de jornal. Chegou a fazer inúmeros vestidos para um único desfile das debutantes do Clube Doze de Agosto, o mais tradicional de todos na Ilha, durante décadas. O mesmo valia para casamentos, formaturas e o Baile Municipal, com que o mesmo Doze de Agosto abria oficialmente o Carnaval, todos os anos. “As pessoas ficavam dias de plantão na frente do clube para garantir uma mesa para o Municipal”, conta ela.

Baile Branco do Clube Doze de Agosto – Foto: Acervo Clube Doze de Agosto/Divulgação/NDBaile Branco do Clube Doze de Agosto – Foto: Acervo Clube Doze de Agosto/Divulgação/ND

Para manter seu negócio, trabalha das 6h às 23h, praticamente todos os dias, e só dorme após conferir as novidades do mundo da moda pela internet. É nessa fonte que bebe para deixar sua clientela a um o das tendências internacionais – nunca copiando, mas adaptando o que é ditado lá fora ao perfil das pessoas que a procuram no atelier. Com demanda sempre no topo, Erica diz não ter tempo para fazer as próprias roupas. Isso a incomoda um pouco, porque todos a olham de cima a baixo, como se, como estilista, devesse estar sempre impecavelmente vestida.

“Sou estilista, mas não fico observando, nas festas, o que as pessoas estão vestindo, a não ser que chamem muito a atenção”

Máscaras e camisolas personalizadas durante a pandemia

Com a experiência que os anos trouxeram, Erica Thiesen é como um médico que conversa demoradamente com o paciente durante a primeira consulta. Ela quer saber a que tipo de evento a cliente vai com o vestido novo, o horário da festa, o ambiente que vai frequentar e até a cidade de onde vem. Mulheres de Brusque e Blumenau estão entre suas freguesas mais contumazes, porque seu nome hoje é amplamente conhecido em todas as regiões do Estado. Ao se tornar amiga das clientes, conhece seus gostos e percebe onde pode encaixar este ou aquele detalhe, um item específico, um diferencial que será percebido por todos durante a festa.

“Já fiz o vestido de uma noiva que casou num castelo, em Milão. Outras preferem fazer a cerimônia na praia. Tudo depende do sonho de cada mulher”

Se a pandemia impactou as vendas, o boom imobiliário de Florianópolis, que foi excepcional nos anos recentes, ajudou a potencializar a criatividade e o arrojo da estilista. Durante a crise sanitária, criou máscaras personalizadas de seda pura que foram vendidas aos milhares. Também criou uma linha de camisolas para mulheres que se obrigaram a ar meses em casa e poderiam receber visitas assim mesmo, à vontade e com elegância. As camisolas personalizadas para noivas “foram um sucesso”, nas suas próprias palavras. “O contexto pedia isso”, explica.

Sem vocação para as roupas clássicas, Erica aposta em modelos mais agressivos, diferenciados, para se destacar no mercado. Sabe que cada coleção tem vida curta, mas as redes permitem que possa oferecer aqui, com um toque pessoal, o que Milão ou Paris estão projetando para aproxima estação. “A moda é muito dinâmica e as grandes grifes se obrigam a criar novas linhas a cada quatro meses”, afirma. É pena que uma roupa que pode durar 10 anos envelheça em tão pouco tempo. “Não se repetir é um desafio permanente das marcas internacionais”, diz ela.

“Hoje, muitas pessoas levam em conta o impacto ambiental do produto que compram. Também noto cada vez mais senhoras idosas se divertindo sem culpa e assumindo os cabelos brancos”

Cafuné e bronca nos netos

Erica Thiesen ensina que o segredo do sucesso de um vestido, por exemplo, “é a fineza, não o espalhafato”. Sempre leva em conta o momento econômico do país e pesquisa as tendências da moda para seguir na crista da onda. Na internet, observa sempre o melhor fio, como ele foi criado e a melhor tintura de cada tecido. Se elegância é atitude, a matéria prima precisa ter qualidade, para fechar o círculo de forma a manter e fidelizar a clientela.

“O sapato é um item essencial para as mulheres. Sempre observo o calçado que estão usando, e em função dele procuro oferecer a roupa certa”

Em seu atelier, Erica Thiesen fala de quanto está realizada e feliz com a profissão que abraçou e com a família que tem – quatro filhos, nove netos e três bisnetos. Uma de suas netas fez a faculdade de moda e também é estilista. É ela que dará prosseguimento ao seu trabalho, com a visão da geração a que pertence.

Em sua casa, em Jurerê, é a avó perfeita, que conversa, estimula e, se for necessário, dá bronca nos netos que extrapolam na balada. Recebe a todos com a mesa farta, espalha colchões para o sono reparador, mas se dá o direito de coibir excessos. “Meus netos não dão conta de mim”, diz ela, rindo.

Floripa 350

O projeto Floripa 350 é uma iniciativa do Grupo ND em comemoração ao aniversário de 350 anos de Florianópolis. Ao longo de dez meses, reportagens especiais sobre a cultura, o desenvolvimento e personalidades da cidade serão publicadas e exibidas no jornal ND, no portal ND+ e na NDTV RecordTV.

No mês de agosto, o projeto irá contar histórias de ‘Mulheres da Ilha’. Personagens com diferentes perfis que fazem a diferença na Ilha da Magia.

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