A folha de pagamento dos servidores e os encargos sociais comprometem cerca de 80% das despesas mensais da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Ao mesmo tempo em que a istração reclama dos poucos recursos que sobram para investir, existe uma falta de controle da jornada de trabalho e até do salário dos funcionários, segundo relatórios de auditoria da CGU (Controladoria-Geral da União). Os auditores identificaram problemas como irregularidades na concessão da flexibilização da carga horária para 30 horas semanais, jornadas de mais de 60 horas (além do limite determinado pela Procuradoria Federal) e o pagamento de salários acima do teto constitucional para servidores públicos da universidade.

O técnico istrativo em educação, Gabriel Martins, lembra que a proposta de flexibilização da jornada de trabalho para 30 horas existe desde 1995 e não se restringe à UFSC, envolvendo servidores de universidades federais de todo o país. A ideia, segundo ele, é cumprir o fim social da universidade ao ampliar o horário de atendimento à comunidade para 12 horas ininterruptas. “O horário das 8h às 12h e das 14h às 18h não contempla a necessidade da comunidade universitária. As aulas são das 7h30 às 22h. Grande parte dos estudantes trabalha e só tem o horário do almoço ou o período da noite para ser atendido. Da forma como é hoje, eles ficam prejudicados”, diz.
Em 2012, segundo Martins, a proposta de flexibilização foi levada à reitoria da UFSC. Durante nove meses, foi feito um estudo sobre a viabilidade de ajustar a jornada sem a necessidade de contratação de mais servidores, e a conclusão foi positiva. Em 2014, houve uma greve dos técnicos istrativos, durante a qual implantaram a jornada de 30 horas na prática pelo período de dois meses.
Nesse mesmo ano, uma série de portarias foi publicada concedendo a flexibilização do horário para alguns setores, como a BU (Biblioteca Universitária), sem um critério claro, segundo relatório da CGU. A forma como foi feita essa concessão foi considerada irregular por estar em desacordo com o decreto 1.590/95, que prevê o atendimento ao público de 12 horas contínuas.
O reitor Ubaldo César Balthazar explica que a jornada de 30 horas semanais está sendo implantada nos setores de atendimento à comunidade, mas a flexibilização tem de ser feita pontualmente, atendendo às necessidades de cada setor. “Cada setor tem de ser analisado com cuidado. A decisão é do setor. O gabinete da reitoria, por exemplo, quer manter as 40 horas. Junto com a flexibilização, é feito um controle de produtividade”, explica.
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Horário de trabalho é registrado à mão
Em paralelo à questão das irregularidades na flexibilização da jornada para 30 horas, os auditores da CGU identificaram falhas no controle do ponto dos servidores. O técnico istrativo Gabriel Martins afirma que a maioria dos funcionários registra o horário de trabalho por meio de uma ficha preenchida à mão.
Representante da comissão de negociação com a reitoria sobre esse assunto, Martins entende que essa não é a forma ideal. “Existem alguns setores com ponto eletrônico, mas esse método também é fácil de fraudar. O que nós propomos é a publicização dos horários de trabalho do servidor, o que é mais difícil de burlar”, analisa. A proposta dos servidores seria tornar público, na internet e por meio de cartazes afixados nos postos de atendimento, qual é o horário de funcionamento e quem estará lá para atender.
Esse assunto foi alvo de investigações da PF (Polícia Federal) em 2015, com a Operação Onipresença. Na época, foram indiciados 26 médicos que não cumpriam a carga horária no Hospital Universitário e, mesmo assim, recebiam salários sem desconto. Esse esquema trouxe prejuízo de R$ 36 milhões aos cofres públicos, de acordo com a PF.
Falhas no ponto motivam uso de controle social
Outro ponto levantado pelos relatórios de auditoria é a jornada de 60 horas, acima do limite previsto pela Procuradoria Federal. Foram identificados 157 casos de jornadas incompatíveis. O superintendente substituto da CGU, Marcelo Campos da Silva, lembra que o problema não é de hoje: “Fizemos em 2012 uma recomendação para melhoria do controle da jornada dos servidores e, até hoje, as medidas não foram tomadas a contento”.
A reitoria afirma que o problema está sendo investigado pela universidade e que estuda uma nova forma de registro do horário de trabalho, que está em consonância com a proposta dos técnicos. “Estamos discutindo o controle social, que é uma mudança de cultura. O próprio servidor registra seu horário, e isso fica disponível on-line para qualquer cidadão conferir”, afirma o reitor Ubaldo César Balthazar.
Nas auditorias da CGU, foi identificado o pagamento de salários acima do teto constitucional de R$ 33.763 para, pelo menos, 21 servidores da universidade. A reitoria nega que existam os supersalários. O reitor explica que, quando o valor passa do limite, é automaticamente cortado. “Ainda não me trouxeram situações de servidores que recebam acima do teto. O que acontece é que há pesquisadores que recebem por projetos em que trabalham. É o caso de royalties por patentes ou bolsas de pesquisa, que a legislação ite o recebimento. No somatório, pode ultraar o teto. Mas não é vencimento. O que excede não faz parte do orçamento da universidade, são recursos externos”, argumenta o reitor.
Flexibilização de jornada
O que diz o relatório 9.963 (Relatório de Auditoria Anual de Contas)
– A concessão da flexibilização da jornada de trabalho para seis horas, resultando em carga horária de 30 horas semanais, não está em consonância com o estabelecido na legislação vigente, haja vista a deficiência dos estudos utilizados para fins de autorização de flexibilização de jornada e o descumprimento dos requisitos do art. 3º do Decreto 1.590/95, o que demonstra que os controles se mostram inconsistentes.