A segunda entrevista da série “Rumo ao Planalto”, entrevistas exclusivas que estão sendo exibidas no telejornal ND Notícias e demais plataformas do grupo, é com o atual governador de São Paulo, João Doria (PSDB).

Ele disputa com o governador gaúcho, Eduardo Leite, e o ex-prefeito de Manaus (AM), Arthur Virgílio Neto, as prévias do partido neste domingo (21). Um deles será o candidato oficial da sigla para tentar ocupar o lugar de Jair Bolsonaro.
Dentro do projeto de cobertura das eleições 2022, o Grupo ND vai revelar aos catarinenses o perfil e os projetos dos pré-candidatos à Presidência da República.
O governador paulista concedeu entrevista ao comentarista político Altair Magagnin, que viajou a São Paulo especialmente para conversar com o pré-candidato do PSDB.
Na longa conversa, ele fala de temas políticos e econômicos, do rompimento com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e da possibilidade do surgimento de uma terceira via para eleições presidenciais.
O que motiva um homem que está, teoricamente, em uma zona de conforto, a ir para a política?
O que motiva é o Brasil. Comecei minha vida de forma muito humilde aos 13 anos. Comecei a trabalhar como office boy de uma agência de publicidade e trabalhava para comprar comida para nossa casa.
Meu pai não estava no Brasil, meu pai foi cassado pelo Golpe de 64, foi para o exílio e ficou 10 anos fora do Brasil. Meu pai não tinha mais dinheiro para nos sustentar. Essa é uma fase muito dura.
Muitas pessoas acham que eu nasci pronto, nasci arrumado, nasci penteado, nasci com roupa desse ou daquele tipo, calça apertada. Eu nasci com muita dificuldade, enfrentando o desafio de ter um emprego para ajudar minha mãe.
Isso me trouxe o aprendizado do trabalho, da decisão, do esforço, do amor pelo Brasil. Eu tive êxito. Porque consegui evoluir no emprego… Até construir um grupo empresarial de onde me afastei há exatamente seis anos para disputar a prefeitura de São Paulo.
E vim para defender o Brasil contra Lula e o PT. Essa foi a minha maior motivação, foi isso que me fez sair da zona de conforto para vir onde eu estou, no front.
No próximo dia 21 teremos o resultado do candidato que vai representar o PSDB para ser mais do que a terceira via, para ser a melhor via, a melhor via para o Brasil.
Não é nem a via de Lula, nem a via de Bolsonaro. Eu sou um social liberal e como tal defendo mais privado e menos público. Portanto, temos sim uma proposta para o Brasil.
Por que é tão difícil empreender no Brasil, por que é tão difícil gerar emprego, gerar renda. Como o Estado pode ajudar mais?
Já foi pior, já foi bem pior. Vou dar o exemplo de São Paulo. Quando eu assumi a prefeitura de São Paulo para você abrir uma microempresa ou uma empresa eram 126 dias, mais de quatro meses para simplesmente abrir.
O esforço que fizemos foi para desburocratizar a prefeitura e depois prosseguimos aqui no governo do Estado. Sabe em quanto tempo você abre uma empresa onde há seis anos você precisava de 126 dias? Hoje você abre uma empresa em SP em quatro horas. Hoje o Estado de São Paulo é um Estado digital e que apoia o empreendedorismo.
São Paulo está se apresentando como a capital mundial da vacina. Por que esse título, o que esse título significa?
Aqui a ciência venceu a ignorância. A opção que fizemos pela vacina era correta. A opção que fizemos pela quarentena, pelo uso de máscara, pelo distanciamento, era correta, salvamos milhares de vidas e salvamos a economia.
São Paulo hoje é quem mais vacinou no Brasil. Compramos mais vacinas, nunca recomendamos kit cloroquina, nunca dissemos que máscaras eram para covardes ou maricas, como ouvíamos do governo federal, e sempre apoiamos a ciência. E fizemos isso na forma correta.
Em 2018, o senhor fez uma aliança que ficou conhecida como BolsoDoria. O senhor já declarou publicamente que se arrepende amargamente dessa aliança. O senhor já respondeu em parte, por que o senhor se arrependeu dessa aliança, ter feito campanha e voto para o presidente Jair Bolsonaro?
Primeiro, contra o PT, não poderia fazer campanha a favor do PT. Eu venci o PT aqui em SP. Venci Lula (ex-presidente), venci Fernando Haddad (ex-prefeito de SP), venci Dilma Rousseff (ex-presidente).
Tudo que eu não precisava era fazer opção pelo PT e acreditei em Jair Bolsonaro (sem partido), que mentiu, mentiu para mim e para milhões de brasileiros, dizendo que faria um governo liberal, governo transformador, um governo pela ética e um governo pelo combate à corrupção. Duraram meses, poucos meses, aliás, essa opção.
O chamando “mais Brasil menos Brasília” o que se viu até hoje foi só Brasília e nada de Brasil. Vimos a ruptura do pacto federativo, distanciamento dos governadores.
O presidente Jair Bolsonaro fez uma única reunião com os governadores em quase três anos, no mês de janeiro de 2019.Demitiu Sergio Moro e outros 21 ministros. Nunca na história do Brasil nós tivemos tantos ministros demitidos num prazo inferior a três anos.
A economia desandou. A inflação está em mais de 10%. As pessoas mais simples, mais humildes, que conseguiam ainda com seu emprego comprar o feijão, comprar o arroz, já não compravam carne, mas conseguiam subsistir, hoje se alimentam quando recebem de graça, quando recebem de alguém, de uma igreja, de uma instituição, de um governo, o prato para seu alimento ou uma cesta básica para se alimentar.
Na Cúpula do Clima em Glasgow, na Escócia, o Brasil foi indesejado, condenado pela sua falta de políticas ambientais. O meio ambiente não é inimigo do agro, o agro não é inimigo do meio ambiente. Provamos isso aqui em SP. O governo federal se distanciou dos mais pobres, dos mais humildes, não trabalhou pela redução da pobreza e a economia não cresceu.
O senhor revisa de alguma forma as opiniões sobre o ex-presidente Lula ados esses anos? E ado o impacto do presidente Jair Bolsonaro em todo esse contexto que nós vivemos?
Não, a minha opinião sobre Lula é a mesma que eu tinha em 2016, que eu tinha em 2018 e é a que eu tinha em 2020 e hoje. Eu não quero ser ofensivo ao ex-presidente Lula, mas ninguém vai me convencer de que os fins justificam os meios.
Você promover o Mensalão, Petrolão, roubar o dinheiro público, ainda que com o objetivo ou sob alegação que você vai fazer política pública para os mais pobres, isso não é correto.
Você pode ser uma pessoa dedicada aos mais pobres, como nós estamos sendo aqui, e não foi preciso roubar dinheiro público. Não foi preciso ter leniência com o dinheiro público nem aceitar Mensalão, Petrolão, nem o assalto ao dinheiro público e nem também à rachadinha.
Rachadinha é crime. Nós não podemos compactuar com isso. O Ministério Público do Rio de Janeiro, o MP de São Paulo e o MP de Brasília já identificam claramente que não só Jair Bolsonaro, como os seus três filhos praticaram rachadinha.
Isso é roubo, isso é assaltar o dinheiro público. Nem Mensalão, nem Petrolão, nem rachadinha, nem rachadão. Eu quero um país honesto para meus filhos e para vocês.
A narrativa de ajuda aos mais pobres voltou com a PEC dos Precatórios, com a necessidade de furar o teto de gastos, eventualmente descumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal, com esse fim de aumentar o Auxílio Brasil. Esses assuntos são difíceis para a população em geral entender. Que reformas são necessárias para que o cidadão tenha uma percepção maior dos serviços efetivamente realizados?
Primeiro a prática da honestidade mais uma vez. Romper o teto de gastos, apoiar a PEC dos Precatórios é crime, é crime de responsabilidade. Foi esse mesmo crime que levou ao impeachment da ex-presidente Dilma.
Você não pode gastar mais do que aquilo que você arrecada. Quem paga essa conta depois é você. São as pessoas mais pobres, porque isso gera inflação. Gerando inflação, mais brasileiros perdem o emprego, mais brasileiros não terão o que comer.
O governo deveria ter feito sua lição de casa, diminuído as suas despesas. Nós fizemos aqui em São Paulo. Reforma istrativa o governo não fez e agora propõe a ruptura do teto de gastos e ainda propõe um orçamento em que se esconde a destinação de recursos.
Se encobre a destinação de recursos para parlamentares que apoiam o governo. O princípio disso não é fazer política para os mais pobres, é fazer política para Bolsonaro que quer sua reeleição.
Se ele tivesse compaixão do seu povo, teria providenciado vacinas, teria estimulado a aquisição de respiradores, teria permitido que muitos brasileiros que se foram pudessem estar hoje ao lado de seus familiares vivos por terem a vacina no tempo certo.
A ruptura do teto de gastos é criminosa, haverá um embate pela frente eu não tenho dúvidas, o Supremo Tribunal Federal é a corte suprema do país.
Ele é o guardião da Constituição, não pode o governo achar que faz tudo e que, da mesma maneira que o PT roubava o dinheiro público para justificar Mensalão e Petrolão para ajudar o mais pobre, não pode o atual governo roubar o dinheiro público com a alegação de fazer o Auxílio Brasil.
Nós temos hoje 30 milhões de brasileiros em situação de pobreza, 15 milhões de desempregados, 15 milhões de subempregos, pessoas que vivem com R$ 50 por mês. Ninguém vive sem emprego, ninguém sobrevive com R$ 50 por semana com a família de cinco pessoas.
Essa é a triste realidade do Brasil. E esse governo só se preocupa com a reeleição. Por que não faz a sua lição de casa? Por que não permite a redução do tamanho da sua estrutura e a privatização de suas empresas, que prometeu e não fez?
O discurso da terceira via precisa despertar paixão no eleitor. Como despertar essa paixão? O que o eleitor espera ouvir e de que forma o senhor espera cativar o eleitor?
Falando a verdade e fazendo campanha. Essa é a beleza da democracia. A democracia permite que em uma campanha eleitoral se apresente e apresente suas propostas. O candidato que vencer as prévias do PSDB terá a oportunidade de rodar todo o Brasil, como, aliás, eu acabo de fazer para as prévias do PSDB, dialogando, olho no olho com as pessoas.
As pessoas gostam de ver o candidato próximo e não apenas na tela da televisão ou nas ondas do rádio e apresentar as suas propostas, as propostas daquilo que você fez.
São Paulo fez a lição de casa, SP neste período foi o Brasil que deu certo, como outros Estados também. Nós fizemos educação, fizemos saúde pública, trouxemos a vacina, aumentamos a habitação popular sem dinheiro público.
Fizemos as rodovias estaduais, diferentemente de Santa Catarina que vai ter o apoio, mas vai ter o apoio agora, porque Santa Catarina tomou a iniciativa [o governo catarinense fez um acordo de cooperação técnica com DNIT que garantirá a aplicação de recursos estaduais para acelerar as obras federais nas BRs 470, 163, 280 e 285]. Foi o governador Carlos Moisés (sem partido) que tomou essa iniciativa, não foi o governo federal.
Gelson Merisio, Vinicius Lummertz, Clesio Salvaro, Geovania de Sá. Qual desses nomes o senhor gostaria de ver candidato ao governo de Santa Catarina pelo PSDB?
[Risos] São todos ótimos nomes. Não cabe a mim tomar essa decisão, cabe ao PSDB em SC. Mas todos esses nomes que você citou são grandes nomes. São pessoas corretas, que têm uma biografia em Santa Catarina na vida pública, seja legislativa, seja no Executivo.
Se me permite uma sugestão: façam prévias. É a forma mais democrática de garantir, sem brigas, sem conflitos, a opção que os eleitores do PSDB vão desejar.
Eu tenho um carinho especial por Santa Catarina, talvez você não saiba, eu sou casado com uma catarinense. Bia, minha esposa, é do Oeste de Santa Catarina, é de Pinhalzinho. Minha sogra reside lá, as minhas cunhadas residem lá. Portanto tenho três filhos que têm sangue catarinense. Eu tenho razões de sobra para gostar, para amar e respeitar SC.
O que o senhor espera no futuro bem curto depois das prévias e uma perspectiva de Brasil no futuro de médio e longo prazo?
Eleições! É aquilo que a democracia prevê. E é por isso que nós estamos fazendo as prévias no PSDB. Para que no início do ano que vem o vencedor dessas prévias possa ser um agregador, possa ser um nome que traga outros partidos e outros bons nomes para formar uma ampla e positiva frente democrática para que nós tenhamos opção que não será nem Lula nem Jair Bolsonaro, mas sim de uma candidatura de centro, de centro-direita, eventualmente até de centro-esquerda, mas com uma visão liberal, eu sou um liberal.
Eu sou um liberal social, porque eu reconheço também que um país com tanta pobreza, tanta miséria, não podemos apenas transferir para o setor privado a responsabilidade de geração de emprego e de iniciativas.
Cabe sim ao Estado fazer aquilo que lhe é dever, mas deixar o setor privado atuando onde o setor privado, os empreendedores, fazem melhor, geram mais emprego, são mais eficientes, são mais rápidos, e produzem melhor.
Esse é o Brasil que eu desejo. O Brasil da educação, da saúde, da habitação social, o Brasil que pode reduzir a distância entre os mais pobres e os mais ricos, sem penalizar os ricos.
Mas dando oportunidade aos mais pobres se tornarem ricos, como empreendedores, como empregados contratados em carteira, e podendo evoluir ao longo do seu emprego para formar seu patrimônio e terem orgulho de dizer “eu sou empregado”, “eu sou dono do meu destino”, “eu não recebo aqui piedade e benefício para ficar em casa”, “eu trabalho e a contrapartida do meu trabalho é o meu salário”. Esse é o Brasil que eu desejo.