Buscando o feito inédito de serem eleitas vereadoras em Florianópolis, 16 candidatas negras não receberam verba de seus partidos para a campanha.
A regra eleitoral impõe que 30% das candidaturas seja feminina, mas não impede que muitas delas tenham dificuldades para divulgar suas propostas.

Em Florianópolis, 36 mulheres negras são candidatas. Até segunda-feira (9), o maior valor destinado a uma delas foi de R$54.463,28. Já o menor foi R$ 1.500, usado como única fonte de recurso declarada até a data de consulta no site de divulgação de contas eleitorais do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Entre as 15 candidaturas de mulheres negras que ainda não receberam verbas do fundo eleitoral, uma é do PL, duas do PSDB, três do PSD e duas do Republicanos. As outras sete pertencem ao Solidariedade e nenhuma dessas postulantes do partido possui páginas da campanha ou sites nas redes sociais. Uma das candidatas tem como foto de urna um retrato 3×4.
“A gente fica para trás” 6p1kx
Graziela dos Santos, a Nega Grazi, resolveu se candidatar à vereadora em Florianópolis para trazer melhorias à comunidade Nova Esperança, no Monte Cristo. Para a campanha, pensou em imprimir adesivos, fazer faixas e percorrer as ruas do bairro para falar sobre suas propostas.
Os planos, contudo, esbarraram na falta de verba. Candidata pelo partido Republicanos, Grazi contou com a ajuda de amigos para fazer sua propaganda. Conseguiu juntar R$ 700, o que foi suficiente para imprimir alguns adesivos.

A funcionária da Comcap, só recebeu dinheiro do partido na última sexta-feira (6), pouco mais de uma semana antes do pleito. O valor, entretanto, ainda não está declarado no site do TSE.
Com os R$ 15 mil que foram disponibilizados, ela pensa em contratar cabos eleitorais e pagar a gasolina para que os mesmos ajudem a popularizar seu nome.
Outras 15 candidatas negras em Florianópolis não receberam o dinheiro do fundo eleitoral. Faltando menos de uma semana para o pleito, as campanhas acabam prejudicadas. “A gente fica para trás”, comenta Grazi.
“Não existe campanha sem dinheiro” 2n702c
Lirous K’yo Fonseca Ávila lembra que quando resolveu se candidatar deixou claro ao partido que queria recursos para bancar a campanha. “Se era para eu estar lá, eu queria ter uma campanha digna como qualquer outro candidato”, diz. Ela concorre pelo PL.

Ainda na pré-campanha foi autorizada a montar uma equipe para que pudesse desenvolver materiais de divulgação. Conta que o orçamento chegou a ser aprovado, mas que há duas semanas, com a equipe pronta, foi orientada a dispensar todos. A explicação, segundo ela, é de que não havia dinheiro para pagá-los.
A falta de dinheiro também gerou o encalhe em sua casa de 5 mil folders e 1 mil adesivos que o partido imprimiu. Lirous conta que não quis expor amigos e possíveis cabos eleitorais à panfletagem nas ruas.
“Como que eu vou expor as pessoas num momento de pandemia por amor à camiseta, sem a garantia de poder dar um dinheiro caso aconteça alguma coisa? Não existe campanha sem dinheiro”, conclui.
Partidos podem financiar apenas uma candidata 492me
Membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/SC, Luiza Portella explica que os partidos políticos contam com duas fontes de recursos públicos para financiar campanhas eleitorais: o fundo partidário e o fundo eleitoral.
O primeiro é distribuído aos partidos anualmente e o segundo é liberado para as legendas na época das eleições. De acordo com a norma, os partidos são obrigados a reservar 30% do total recebido do fundo eleitoral para o financiamento de campanhas femininas, ou em percentual correspondente ao número de mulheres que se candidataram.
No entanto não é obrigatório que os partidos destinem a verba para todas as candidaturas. “Os partidos são obrigados a destinar pelo menos 30% do fundo para as candidaturas femininas. Só que isso não significa que eles precisam encaminhar recursos para todas as candidatas”, relata.
Da mesma forma, o partido não é obrigado a distribuir recursos a todos os candidatos homens. Isso vale ainda para a candidatura de negros ao pleito deste ano.
Em agosto, o TSE criou a reserva financeira para candidaturas negras, obrigando os partidos a destinar recursos do fundo eleitoral de maneira proporcional ao número de candidatos negros e brancos. Contudo, cabe ao partido escolher as candidaturas que considera mais viáveis para destinar recursos.
Pela regra eleitoral, os partidos têm até o dia 15 de dezembro para o encaminhamento à Justiça Eleitoral da prestação de contas da campanha dos candidatos.
SC tem 286 candidatas negras o4g1p
Em Santa Catarina, 286 mulheres negras se candidataram às eleições deste ano. Isso representa 38,65% do total de candidatos em todo o Estado.
Ao todo, 740 negros concorrem em Santa Catarina: oito ao cargo de prefeito, 12 como vice e 720 tentam se eleger vereadores.
O número de candidaturas é 61% maior do que em 2016, quando 457 negros concorreram no Estado. No último pleito, 19 foram eleitos — um prefeito e 18 vereadores, o que representou 4,3% dos escolhidos.
Contrapontos 6p1l4f
O Republicanos afirmou ter seguido as normas do TSE aplicáveis neste pleito, assim como a decisão do STF que determinou a aplicação da cota de candidaturas negras em 2020.
Por meio de sua assessoria jurídica, o partido disse ainda que em Florianópolis todas as candidatas negras receberam rees financeiros.
“Os percentuais são calculados conforme porcentagem aferida no Estado de Santa Catarina e foram todos cumpridos. Os rees foram feitos diretamente pelo Diretório Nacional para as contas das candidatas”, informou a assessoria jurídica.
A reportagem tentou contato com o PL e o Solidariedade até às 14h30 desta quarta-feira (11), mas não obteve retorno. O espaço está aberto para seus contrapontos.