Há um ano e meio fui diagnosticada com transtorno de ansiedade e, desde então, travo uma batalha diária para manter a vida funcionando minimamente. Na época, minha filha tinha 4 anos, eu já trabalhava como jornalista autônoma e tinha ado os dois anos da pandemia entre cuidados com a casa, a filha e trabalho.
A primeira crise foi em um shopping num dia qualquer, mas lembro que na ida já me sentia um pouco estranha, inquieta. Na praça de alimentação veio a sensação de afobamento junto com sintomas de taquicardia, respiração ofegante e sentimento de morte. Lembro também de olhar minha filha e pensar no que ela estava sentindo e imaginando ao me ver sendo assistida pela família.

Dali em diante, o primeiro pensamento ao acordar era “será que vou ter outra crise daquela?” e eu tinha, óbvio, porque a ansiedade é isso, sofrer por antecipação (80% das vezes o que se prevê não acontece, diga-se de agem), mas como o meu copo já havia transbordado, pensar positivo não funcionava mais.
Enfim, procurei ajuda médica e recebi o diagnóstico de transtorno de ansiedade ou ansiedade generalizada. Foi recomendado uso de medicação e terapia semanal. Confesso que fiquei abalada, mas entendi que tem vezes que só a medicação é capaz de salvar. E salvou.
Foi na terapia que compreendi um pensamento que teima em aparecer no início de uma crise, principalmente quando estou sozinha com minha filha. Minha mente cria cenas do tipo a criança indefesa assustada tendo que pedir ajuda porque a mãe está ando mal, eu desmaiando e a pequena perdida sem saber o que fazer e por aí vai…
E isso para mim, como mãe, era (ainda é, confesso) inconcebível. Porque é a mãe que socorre, a mãe que cuida, que protege, a mãe que não quer traumatizar as crias. Não é isso? Pelo menos é o que injetaram na nossa cabeça, a mãe tem que ser perfeita, a mãe tem que dar conta, imagina uma mãe que dá trabalho, que horror! Pois é…
Doenças mentais ainda são um tabu na sociedade, o diagnóstico parece ser um atestado para maluco, eu mesma senti isso. Só que a cada ano aumenta o número de pessoas com problemas de ansiedade e depressão no mundo.
O Brasil, por exemplo, tem a maior população com transtornos de ansiedade no mundo. De acordo com o último mapeamento da OMS (Organização Mundial da Saúde), 9,3% dos brasileiros sofrem de ansiedade patológica.
A pandemia de Covid-19 ainda desencadeou um crescimento de 25% no aparecimento de doenças mentais na população mundial, segundo a OMS. Eu faço parte desta taxa que, além do isolamento social de dois anos, ainda tenho toda a sobrecarga da mulher/mãe, questões não resolvidas e traumas que surgem durante a vida.
O tratamento medicamentoso durou um ano, agora mantenho a terapia em dia, faço exercícios físicos diariamente, não tomo mais café como antes e tento ao máximo dormir bem. ei a prestar mais atenção aos sinais da mente e do corpo, entendi o que me dá gatilho para uma crise e já sei onde focar para não dar tanta atenção para os pensamentos negativos.
Entretanto, eu nunca mais fui a mesma. Não bastava a mudança drástica trazida pela maternidade, agora eu levava o segundo plot twist da vida. Ainda que minha terapeuta bata na tecla que há cinco minutos eu já não sou quem eu era, eu sofro um pouco por isso.
A mãe que saía todos os dias com a filha, nem que seja para o parquinho, a mãe que inventava vários programas para fazer durante a semana e aos finais de semana, a mãe que curtia muito sair só ela e a cria, ela não existe mais. Agora eu penso duas vezes antes de sair de casa. Se for com a filha penso três. Chuta o que vem junto de tudo isso? A culpa.
Contra todas as possibilidades, eu consigo enxergar algo positivo nisso tudo. Hoje eu sei quem eu sou, como funciono, o que quero e o que não quero, aliás dizer “não” é uma dádiva e o mais importante: eu não sou um diagnóstico. A ansiedade não me resume. Aliás, eu sei que muito do que anseio vem das falhas de um sistema social que fabrica mães enlouquecidas, mas esse assunto eu trago em outra coluna.