A decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), na quinta-feira (17), sobre os governos estaduais, municipais e federais estabelecerem medidas compulsórias para a vacinação contra a Covid-19 é vista por especialistas em direito e em saúde como positiva para o combate à pandemia que afeta o País há quase dez meses.
André Báfica, professor de imunologia da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), afirmou que é importante que a população entenda que a vacina protege a coletividade e que para alcançar a chamada imunização de rebanho é necessário vacinar 70% da população. “Do mesmo jeito que entendemos que se não bebermos água iremos morrer, temos que entender que a vacina nos protege contra a doença”, disse.
O professor, que é doutor em patologia humana pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), explicou que quando a vacinação não alcança um grande número de indivíduos o patógeno, no caso o novo coronavírus, pode ficar mais resistente e deixar até quem já está imunizado suscetível à contaminação. “Quando a pessoa se vacina, está protegendo a si e protegendo o outro”, resumiu Báfica.
Para o especialista, não há motivo para dúvidas quanto à segurança e eficácia da vacina, pois o conhecimento científico avança a os largos sempre em busca do melhor para a humanidade.
“Nos mais de 25 anos que trabalho com imunologia e doenças infecciosas posso dizer que essas vacinas estão ando por todos os testes, como todas as outras vacinas que conhecemos. A única forma de voltarmos à normalidade é a vacinação”, afirmou.

O presidente da Comissão de Saúde da Alesc (Assembleia Legislativa de Santa Catarina), Neodi Saretta (PT), considerou correta a decisão do STF por tratar da vida e da saúde pública, que ele chamou de bem maior. De acordo com o deputado, a decisão do Supremo é uma forma de garantir que a vacinação seja disponibilizada para todos os brasileiros.
“O Brasil tem tradição de campanhas de vacinação com esse requisito para que toda a população seja vacinada. Estamos no meio de uma pandemia, o mundo todo busca ansioso pela vacina e esse imunizante é fundamental que seja dado a toda a população, que ele chegue de forma ível. Essa decisão possibilita que toda a população seja imunizada”, disse.
Autonomia da vontade 5a166m
O advogado Marcelo Ramos Peregrino Ferreira, conselheiro da OAB/SC (Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Santa Catarina), disse que “direito individual versus direito coletivo” é uma discussão clássica no direito.
“É surpreendente que isso (debate sobre a obrigatoriedade da vacina) surja agora. Temos um histórico de vacinação compulsória no País. O que o STF decidiu é que haverá sanções para quem não se vacinar, ninguém será vacinado à força”, afirmou.
Marcelo Ramos explicou que há uma diferença entre a recusa terapêutica e a recusa vacinal. Se um indivíduo com determinada doença, por exemplo, se recusa a fazer o tratamento, isso afetará apenas a vida dele, não colocará ninguém em risco. Ao contrário de quando alguém se recusa a ser imunizado.
“Quando a minha decisão não impacta ninguém além de mim, não há problema. Mas se eu recuso a vacinação, eu ponho em risco a vida dos outros. Estamos diante de uma calamidade nacional e você se recusar a ser imunizado é algo que causa espécie”, disse.
Direito individual e coletivo 2b2v6q
“As liberdades públicas em geral são relativizadas. Não existe o direito absoluto do indivíduo valendo-se dos direitos individuais assegurados pela Constituição. Isso é relativizado em função do interesse público, porque o interesse público prevalece sobre o interesse privado”, afirmou o jurista Péricles Prade.
De acordo com Prade, algumas pessoas fazem confusão quanto ao termo “vacinação compulsória” ao acreditar que serão vacinados à força. “Isso diz respeito ao dever e ao poder do estado de tomar as medidas necessárias para garantir o direito à vida, que é assegurado pela Constituição da República. No meu modo de pensar, sequer haveria necessidade dessas duas ações (julgadas pelo STF), porque isso é inerente ao exercício do poder nas três esferas da federação. A vacina é necessária para possibilitar a saúde de todos ou pelo menos do maior número de pessoas”, disse.

Consentimento 5f4a3w
Péricles Prade detalhou que o direito à vida e à saúde, garantido na Constituição, estão ligados à cidadania e à dignidade da pessoa humana e que a obrigatoriedade (ou compulsoriedade) tem os seus limites, ligados aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e do consentimento.
“Genericamente, falando em termos legais, sou obrigado a me vacinar mas tenho o direito de consentir ou não de ser vacinado. O estado não pode, em razão do seu poder e do seu dever, me pegar na marra, me sentar, me forçar e me dar injeção quando eu não quero. Todavia, esse consentimento tem uma regulamentação. Eu não consinto em ser vacinado mas tenho que obedecer a certas restrições. São as chamadas medidas restritivas. O STF se referiu a essas medidas e, no meu entender, está correto o Supremo em exigir existência de lei, ou do governo ou do estado ou do município”.